Transcrição - Mamilos 119: Redes Sociais: Guia de sobrevivência • B9
Mamilos (Transcrição)

Transcrição - Mamilos 119: Redes Sociais: Guia de sobrevivência

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Jornalismo de peito aberto

Esse programa foi transcrito pela Mamilândia, grupo de transcrição do Mamilos

Transcrição Programa 119 – Redes Sociais: Guia de sobrevivência

Episódio transcrito por Dácio Vontobel
Revisão por João Gentil

Início da transcrição:

(Bloco 1) 0’ – 4’59”

[sobe trilha]

[desce trilha]

[Vinheta de Abertura]

Este podcast é apresentado por b9.com.br.

[trilha]

Ju: Mamileiros e Mamiletes. Estamos aqui em pleno feriado gravando só para você não ficar na carência, na sofrência, na abstinência da polêmica nossa de cada dia. Passo o café, puxa o banquinho que hoje é dia de papo gostoso. Eu sou a Ju Wallauer.

Cris Bartis: Eu sou a Cris Bartis. Bem-vindo ao Mamilos.

QUEM FAZ O MAMILOS

Cris Bartis: Mamilos é o resultado do trabalho colaborativo de pessoas apaixonadas, como Caio Corraini, que faz a edição, o Guilherme, Ana e uma equipe linda que faz as equipes sociais, a Jaqueline Costa e um grande elenco no apoio à pauta e a Lu Machado e a cheirosa Mamilândia na transcrição dos programas. Pessoal, a newsletter está indo de vento em popa! Esta semana a gente lança a terceira edição, e já vão ser mais de 500 pessoas recebendo a newsletter, Juliana.

Ju: Gente, a newsletter é mais um canal para você conversar com a gente, mais um canal para você saber o que que nos interessa, quais são as notícias que chamam nossa atenção e o que a gente pensa sobre essas coisas. Mas o mais importante de tudo é que, apoiando a gente no Padrim, você torna o Mamilos viável. Então vocês sabem, vocês sempre comentam com a gente em todo e-mail, a cada programa. Vocês falam: “Nossa! Como é que vocês conseguem ir atrás de gente, estudar pauta? É um puta trabalho. Vocês tocam isso ainda com o trabalho de vocês.”. Pois é. As tias estão cansadas. Está difícil levar essa jornada dupla. E a gente quer muito, muito conseguir se dedicar só ao Mamilos, mas para isso acontecer precisamos do apoio de vocês. Eu não estou falando com outras pessoas, eu estou falando com você mesmo que está nos ouvindo nesse momento.

Cris Bartis: Sim. A newsletter, que é a forma que a gente encontrou de selar esse compromisso de conteúdo de qualidade é a única newsletter no Brasil que chega com você com sotaque, porque as pessoas falam que leem com as nossas vozes.

[risos da Ju]

Cris Bartis: Então veja só. Já tem um diferencial de produto. Assina a newsletter no Padrim e ou no Patreon. Vamos lá, pessoal.

Ju: “Padrim Mamilos”. Vai lá. Com R$ 10,00, vocês ajuda muito o Mamilos e ainda recebe uma newsletter.

Cris Bartis: Ou no Patreon. “Patreon Mamilos”.

FALA QUE DISCUTO

Ju: No Twitter, você pode nos seguir pelo @mamilospod. A Thais Gomes disse: “Amei a vinheta, mas ainda estou refletindo sobre o programa, muito legal, sempre uma bela oportunidade de aprender sobre nós mesmos.”.

Cris Bartis: Denise Baptista disse: “Mamilos batendo forte de novo. Sou professora, e sabe aqueles casos que vc aprende mais que ensina? Então, a maioria foi com alunos TEA♡.”.

Ju: A Carol König‏ disse: “Ótimo esse episódio! Não é “só” sobre autismo, é tb sobre respeitar e conviver com as diferenças!”.

Cris Bartis: E você pode falar conosco no Facebook toda semana lá no “Patreon Mamilos”. O Lucas Sousa disse: “Bom, em primeiro lugar, essas vinhetas ficaram excepcionais! Pura seduzência! Quanto ao podcast, digo que foi sensacional! Agregou muitas informações que eu não sabia, e levar uma autista para debater junto foi uma iniciativa das mais democráticas. Um. Legal que foi dito, e que certamente daria até outro podcast é a questão da educação. Sou deficiente visual e sempre busco estar por dentro de como anda a educação inclusiva no país, e tem alguns aspectos bem complicados. Estão eliminando as escolas exclusivas para deficientes e colocando todos eles em turmas de escolas regulares, com um suporte mínimo, feito por profissionais desqualificados em grande parte, e sem a mínima estrutura da escola. O que isso gera? Milhares de deficientes subindo na escala de férias sem qualquer tipo de conhecimento condizente com isto. O pior não é isso, pior é mudar de série sem conhecer o conteúdo, não pelas limitações da deficiência, mas pelas limitações do sistema. Quando a mãe da garota com autismo explicou o sistema misto presente em Londres, me veio aquela coisa: eu sempre imaginei que ele fosse o modelo ideal. Não é justo segregar os deficientes em lugares específicos apenas, mas também não é justo criar uma falsa inclusão, colocando estes alunos apenas na sala de aula regular, sem subsídios para uma aprendizagem de qualidade. Claro que toda regra tem exceção, mas é bom apontar esses problemas. Abraços deusas do mamilos!”.

Ju: [risos] E por e-mail. Você pode nos mandar e-mail para o [email protected]. A gente responde todos os e-mails com muito carinho. “Olá, minhas divas. Sou mamilete de carteirinha e criei uma grande expectativa com esse podcast, pois sou mãe de um menino de 5 anos que desde aos 3 foi diagnosticado pertencente ao TEA (leve de alto funcionamento, antigo Síndrome de Asperger). Tinha certeza que vcs iam arrasar com o tema, mas vcs acertaram como uma flecha o meu coração. Quando a Júlia falou da empresa que ela trabalha, eu literalmente arrepiei. De todos os lutos que eu passei pós-diagnóstico, o mercado de trabalho foi o que mais me assustou, pois seria o momento em que eu teria que jogá-lo aos leões. Saber que existem empresa que capacitam e contrata pessoas com essa condição, foi a esperança que faltava para a minha missão como mãe azul. Obrigada por serem, mais uma vez, uma luz na minha vida.

[sobe trilha]

(Bloco 2) 5’ – 9’59”

TETA

[Vinheta]

Senta que lá vem polêmica.

[desce trilha]

Cris Bartis: Vamos então para a Teta? Quem está na mesa conosco hoje neste feriado são duas pessoas muito amadas nesse Mamilos: um que vira e mexe está conosco e outro que estava afastado e a gente chamou ele de volta no laço. Boa noite, Terto. Fala um oi para o pessoal.

Ricardo Terto: Olá, Mamilos e Memeleiros. Tudo bem? [risos da Ju] Saudade de vocês. Prazer estar de volta aqui nestes estúdios do B9 curtindo a companhia de pessoas tão agradáveis.

Ju: Neste conglomerado internacional, né? O b9.

[risos]

Ricardo Terto: É. Exatamente.

Cris Bartis: Para quem ainda não teve o prazer de ouvir a sua voz, conte quem é você na fila do pão.

Ricardo Terto: Na fila do pão, eu sou escritor, redator, roteirista, tem um livro chamado “Marmitas Frias”, cuja capa foi ilustrada por um outro convidado, que eu não vou dizer quem é. [risos da Ju] Está aqui. [risos]

Cris Bartis: É tudo lindio.

Ricardo Terto: Acho que é isso sobre mim. [risos]

Ju: Já é muito, não é, Terno? Eu acho bastante.

Cris Bartis: Eu acho. Do outro lado da mesa, temos ele, a voz de veludo do Mamilos, aquele que todos falam: “Amo, amo, amo de paixão.”. Boa noite, Oga.

Oga Mendonça: Olá, povo. Tudo bem?

Ju: Ai! Agora a galera já está feliz. Já não precisamos nem continuar o episódio. [risos da Cris]

Oga Mendonça: Né?

Ju: Já entregamos o que o povo queria.

Cris Bartis: Além de fazer a capa do livro do Terto, o que mais você faz da sua vida?

Ju: Sucesso.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Eu acho que alguém já falou isso nesse programa.

[risos]

Oga Mendonça: Eu vou tentar não repetir piadas. Eu sou designer multimídia, diretor de documentários, enfim. Eu fico brincando de contar a história visualmente em todas as plataformas possíveis e imagináveis e eu adoro brincar com o Instagram. Eu estou me dedicando muito a ele ultimamente.

Ju: Que legal!

Cris Bartis: Eu só queria aproveitar esse início para já soltar duas indicações. Sigam o Terto no Facebook e o Oga no Instagram. AGORA!

Oga Mendonça: Mas, ó. Você não pode ficar incomodado que eu vou floodar o seu Instagram.

[risos]

Oga Mendonça: Porque eu posto muita coisa.

Cris Bartis: Não… É sério.

Oga Mendonça: Para fazer os desenhos, eu tenho que postar muita coisa.

Cris Bartis: Vai pela Tia Cris, segue esses dois nessas duas plataformas que vocês não vão se arrepender.

Ju: E o que a gente vai falar hoje? Hoje a gente vai falar sobre redes sociais. Será que estamos sendo justos com elas? [risos do Terta] Espera… Isso é outro podcast da casa, não é?

[risos de todos]

Oga Mendonça: Eu senti uma certa influência no ambiente.

Ju: Hoje o Merigo não está aqui, mas o Braincast está aqui em espírito. A gente vai fazer um programa bem braincasteiro. Porque o que a gente quer é fazer um papo mesmo descontraído para conversar sobre algumas coisas que têm nos angustiado (a gente recebe muito e-mail de mamileiro, muita conversa com mamileiro e a gente vê que isso está pegando muito para vocês também), que é a questão do flood de informação. A gente recebe muita informação o tempo inteiro e a gente fica naquele dilema: “Bom… Estou vendo uma treta. Tenho que pular? Tenho que pular em todas as tretas?”. Ou: “se eu não pular na treta, eu estou pecando por omissão?” – isso é pecado grave. Ou: “por que todo mundo tem opinião sobre tudo” – né, gente? De repente parece que todo mundo tem opinião sobre tudo, e tem que fazer textão. Está certo? Está errado? Como deveria ser? Quanto isso impacta nas nossas relações? Quanto isso impacta na nossa saúde mental? Meme é uma ferramenta ou é porque a gente não consegue fazer nada sério mesmo e só está atrapalhando a discussão? Em vez de a gente realmente olhar para os nossos problemas e discutir, a gente está aqui fazendo meme? Essas são as coisas que a gente queria conversar um pouco. Eu queria começar puxando a polêmica com isso. A gente tem… principalmente um mamileiro, a gente tem foco na polêmica. E aí, de tanto discutir temas polêmicos, isso às vezes dá umas distorcida na nossa percepção da realidade. A gente conversou um pouco sobre isso no primeiro programa da Série Futuros Possíveis, que foi superlegal, que o Márcio Black falou: “Gente, se vocês estão com a percepção de que está tudo ruim, de que está tudo piorando, que ‘venha logo o meteoro’, vocês estão demais na rede social e de menos na rua. Vão para a rua que vocês vão mudar essa percepção.”. Eu acho que o que ele falou em relação à política nacional serve para tudo na vida. Por que se você começa… A mesma coisa, só para tirar de redes sociais, quando você ficava assistindo noticiário, você fica recebendo Cidade Alerta: a cidade ficou muito mais violenta depois que você começou a assistir Cidade Alerta, você começou a ficar com muito mais medo, você começou a achar que tem muito mais problema. Por outro lado é: “Ah, então ótimo, Juliana! Que bom que você está falando isso! Vamos desligar o Cidade Alerta, que aí os problemas da cidade vão resolver. Não vai ter mais homicídio. Eu posso andar tranquilo na cidade que o problema é o Cidade Alerta… É isso que você está falando?!”. Como a gente lida com essa dicotomia, essa tensão “de excesso me causa angústia” e “eu também não posso esconder a cabeça que nem um avestruz”?

Ricardo Terto: Recentemente eu tive a seguinte experiência. Eu esqueci o padrão do meu celular. Esqueci o padrão de liberação e fiquei sem celular por um tempo porque eu precisei deletar todos os arquivos e começar tudo do zero. A primeira coisa que eu pensei foi: “Nossa! O pessoal vai sentir a minha falta.”.

[risos de todos]

Ju: Como é que a internet vai sobreviver todo esse tempo sem a minha opinião, né, gente?

(Bloco 3) 10’ – 14’59”

Oga Mendonça: É o […] e a Xuxa, né? [risos]

Ricardo Terto: Cara, eu passei do limite do aceitável.

[risos]

Ricardo Terto: Eu estou respondendo a uma entidade qualquer invisível X, que são as pessoas.

Ju: Aham.

Ricardo Terto: Eu já tinha pensado nisso antes quando eu vi uma moça. Até inclusive escrevi sobre isso no Facebook.

Ju: “Vão lá ler a minha opinião, gente. Por favor.”. [risos]

Ricardo Terto: Eu vi uma moça, ela estava mais bem… sei lá, devia ter uns 18 anos. Eu estava mexendo no Instagram e no Facebook. Assim, ela estava basicamente… Qualquer post que ela via que ela não gostava, ela deixava de seguir a pessoa, ela bloqueava e, assim, sem nenhum rancor, sem nenhuma dor no coração. E eu pensando: “Nossa… Isso é uma coisa muito minha.”. Porque a gente avisa quando a gente vai parar de seguir as pessoas, a gente avisa quando a gente vai deixar de postar. “A gente vai ficar uma semana sem celular, tá?” [risos de todos] O mundo continua sem a gente, sabe? [risos] Depois disso, depois dessa experiência, eu comecei a pensar assim. Eu acho que a melhor maneira… Não é a melhor maneira, é a minha maneira. Na verdade não tem uma melhor maneira, vai do que você achar que é interessante. Eu passei a me preocupar menos com a minha presença digital, sabe? Mesmo tendo seguidos etc., eu passei a me preocupar menos. Não que eu vá postar menos, mas eu vou postar sem me preocupar tanto com “quais vão ser as repercussões”.

Cris Bartis: “Qual a repercussão?”.

Ricardo Terto: É. Isso! Sabe? “Nossa…”.

Oga Mendonça: A frequência mesmo.

Ricardo Terto: É!

Oga Mendonça: A frequência não é tão importante no final.

Ricardo Terto: Não é tão importante. Eu não sei se isso é verdade, porque aí tem várias lendas sobre o algoritmo, mas dizem que o algoritmo no Facebook funciona assim: você consegue “burlar” ele ou se você posta muito ou se você posta bem, bem pouco. Eu estou nesse meio termo. Eu não vou conseguir postar muito porque eu não tenho tanto assunto para postar. Mas também, quando você posta quase nada… Eu fico pensando: “Sei lá… Por que eu estou aqui?”. Eu não consigo pensar em nada acho que nenhum radicalismo, nenhum extremismo em relação a isso. Para mim é interessante. Eu acho que a gente leva muito a sério, sabe?

Ju: Mas não em relação só ao que você posta, mas em relação ao que você consome. Porque tem isso. Você acha que o que você está consumindo no Facebook te deixa mais pessimista, te deixa mais irritado, te deixa mais cansado? Ou você acha que “nossa…! É sempre gostosinho entrar no Facebook que aí eu estou um scrollzinho, interajo, vejo gatiños e fico feliz.”?

Ricardo Terto: Meu, sabe uma coisa que eu percebi? Eu percebi que pelo menos no meu feed a maioria das pessoas respondem a coisas que eu não sei que coisas são. Por exemplo, quando começou a questão da Terra plana. Agora as pessoas acreditam que a Terra é plana. Eu não conheço uma única pessoa que acredite que a Terra seja plana.

[risos]

Ricardo Terto: Eu não conheço ninguém. Mas todo mundo postou assim: “As pessoas agora acreditam que a Terra é plana.”.

Ju: Essas pessoas quem, cara pálida?!

Cris Bartis: Quem??

Ricardo Terto: Quem são essas outras pessoas, sabe? [risos] Então eu comecei a realmente não… As notícias são pessimistas, mas eu não me sinto tão pessimista porque eu parei de levar a sério. Tem uma coisa assim acontecendo.

Cris Bartis: Tem um outro, os White Walkers.

Ricardo Terto: Tem outro que não está chegando em mim.

[risos de todos]

Ju: E você, Oga?

Oga Mendonça: Eu estou pensando bastante assim. Recentemente estava conversando com o Black, a gente estava conversando isso com a Matsar. Eu deletei o aplicativo do Facebook do meu celular. Mas por outro lado eu não me senti muito vitorioso [risos da Ju], não me senti muito orgulhoso porque realmente Facebook era uma rede que eu tinha uma relação um pouco diferente. Eu posto muita coisa no Facebook sem estar no Facebook. Eu estou vendo um clipe no Vimeo ou no YouTube, principalmente do YouTube [Ju: Compartilhar.], eu compartilho de lá sem abrir o Facebook. “Gente… Foda!”, escreva lá um texto ou as pessoas me linkam de coisas que eu fiz fora e aí de repente está linkado. Cada vez mais eu fui tentando dar menos a minha opinião ali. Para mim realmente foi muito tranquilo eu falar: “Cara, eu tenho esse tempo de vida. Eu gosto de ler textão. Então eu prefiro estar no Medium do que estar no Facebook, eu prefiro estar no Instagram, me eu não gosto do Stories, eu estou no Instagram, mas eu estou vendo foto. [risos da Ju] Eu comecei meio que gerenciar. Eu falei: “Cara, eu não vou conseguir cortar isso da minha vida.”. Dá uma angústia ab-sur-da. Os tempos que eu fiquei sem celular, eu pensava assim: “Cara, o que eu faço agora com as minhas mãos? Eu não fumo!”.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Tipo assim.

Ricardo Terto: Pois é.

Ju: “Eu não bebo, eu não fumo. O que eu estou fazendo com as minhas mãos.”.

Oga Mendonça: “Eu não bebo, eu não fumo, eu não uso o PC, eu não uso drogas.”.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Eu disse: “Cara, o que eu vou fazer?”. Aí você começa meio a criar mecanismos e brincadeiras e tal para você realmente não estar nas redes sociais. Como a gente faz? Eu fui percebendo muito isso. Eu fui tentando ficar mais esperto com a qualidade do conteúdo que me chega para justamente não entrar em polêmicas bobas. Eu falei: “Cara, realmente eu tenho que prestar atenção no tempo que eu estou perdendo no computador.”. Eu acabo usando aqueles aplicativos de produtividade, o Método Pomodoro. Para quem não sabe, é o método de trabalho que você marca 20-25 minutos (você pode editar isso) trabalhando focado, descansa 5 minutos, 20 minutos trabalhando focado. Eu tentei fazer isso um pouco com a minha relação com as redes sociais, sabe? Tipo assim: “Cara, se eu vou ver bobeira, é um tempo só e parou”, porque você tem outra coisa para fazer.

Ricardo Terto: Política de redução de danos.

[risos de todos]

Oga Mendonça: É um pouco isso, é um pouco isso. Sabe? Vou pular do crack para a maconha.

[risos de todos]

(Bloco 4) 15’ – 19’59”

Oga Mendonça: Porque realmente não vai dar para cortar de uma vez. É irreal. Me agonia muito. Como eu sou um maníaco por informação, eu sou um cara que gosta de ler muito, eu sou um cara que passou por essa coisa do Cultura Snacks, por essa coisa de consumir cultura de uma forma bem fragmentada, eu sei que eu não vou conseguir. Por outro lado, eu tenho preservar um pouco essa coisa de ter uma atenção grande, de poder me aprofundar um pouco nas coisas que acontecem. Sei lá, eu gosto muito do Twitter por exemplo, que eu acho que é uma rede social que bate comigo. Eles fazem um apanhado de notícia do dia, coisas que você precisa saber, você vai lá e vê. Te dá uma falsa sensação que você sabe o que está rolando. [risos de todos]

Ricardo Terto: Você leu a orelha do livro.

[risos de todos]

Oga Mendonça: É. É meio que uma falsa sensação. Mas ao mesmo tempo…

Cris Bartis: Não, não. Você pode assinar a newsletter do Mamilos. [Faz barulho de Caixa Registradora]

[risos de todos]

Oga Mendonça: É que é assim. Eu também virei o louco da newsletter. Li o meio, o nexo, rã-rã-rã, quando eu vi, eu estava lendo oito newsletter por dia. Eu falei: “Gente, para! Para! Eu estou gastando três horas do meu dia vendo besteira…”. [Cris Bartis: Eu fiz ] “Vendo besteira” não, vendo notícia, mas que…

Cris Bartis: Eu fiz uma substituição disso mesmo. Eu acho que agora eu estou usando as redes sociais de um jeito melhor para mim, eu acho. Eu sempre fui viciada em notícia, e o Mamilos vicia a gente em notícias. [Oga Mendonça: É.] A gente acaba dando uma olhada no todo para escolher um tema. A partir dali a gente não lê mais nada porque aprofunda naquele tema específico, mas, até chegar no tema, você acaba passando o olho em tudo para poder ver o que realmente a gente poderia conversar para poder se aprofundar. Eu posto pouco. Eu posto pouco em todas as redes sociais, eu não sou de postar muito; mas eu leio bastante, eu gosto de ver. E aí é complicado porque eu vejo a minha bolha: eu vejo o que o Terto tá lendo, o que o Oga tá lendo, o que a Cris de Luca tá lendo, o que a Juliana tá lendo. Os artigos que os meus amigos publicam, republicam são muito valiosos para mim. Meus amigos fazem boas curadorias de conteúdo para mim, sabe? Às vezes a Juliana facebookeou um negócio lá que eu falei: “Eu estou com preguiça disso.”. Mas aí o Oga vai e faz. E aí o Terto vai e faz o mesmo artigo. Eu falo: “É… Eu vou ter que ler.”, sabe? [Ricardo Terto: Acaba sendo…] Três pessoas que eu considero publicaram a mesma coisa é porque tem alguma coisa interessante aqui. Vou ler esse artigo. Então o meu uso é muito assim hoje. Eu falo bem menos, eu acho que eu até falo menos do que eu deveria, porque eu leio muita coisa interessante e seria legal até compartilhar, mas eu estou com um pouco de preguiça. Aí você vai ter que justificar, você vai ter que colocar um texto para explicar para as pessoas o que é aquilo.

Oga Mendonça: Tem uma coisa meio complicada. Às vezes eu fico meio frustrado. Eu percebia isso muito no Facebook, que foi um momento que eu desistir. Recentemente eu tava testando… eu estou fazendo um trabalho para a Xênia (que já participou aqui) e eu estava testando uma mudança, que era fazer a rede social dela. Aí sem querer eu postei uma foto no meu perfil assim: “Deixa eu ver. Se essa foto é do perfil da Xênia, vai ficar boa.”. E botei. E aí eu mudei: botei uma foto antiga minha. Aí eu vi minhas últimas postagens no Facebook. Eram coisas legais, tipo uma banda incrível que eu descobri, um texto muito sério que as pessoas tinham que ver sobre Hip Hop e feminismo: 15 likes. Aí eu boto uma foto minha, uma foto ok, legal [Cris Bartis: Eu gostei do café e eu dei like.] e deu 300 likes. Aí você quer morrer. Você fala: “Gente…”. Em teoria, está todo mundo assim. Eu estou vendo o melhor post dos meus amigos, porque os meus amigos são legais, postam coisas incríveis, eu preciso ver e a gente vai fazendo essa curadoria tipo Reddit no que tem mais vermelho para cima [Cris Bartis: Você acaba lendo.], você fala: “Eu tenho que ler.”. Três pessoas falaram: “Mas por que, quando a gente posta essas coisas que são mais mundanas e que são mais pessoais, são as que mais bomba?”.

Ju: Porque é uma rede social, não é uma rede de conteúdo. O algoritmo não está setado para trazer o melhor conteúdo, está setado para trazer o que promove mais conexão entre as pessoas, e uma foto sua, provavelmente é uma foto de um momento seu, diz mais para as pessoas do que uma puta ideia complexa que você precisa que elas saibam, entendeu? Então, nisso eu não acho que está errado. Das coisas que a gente falou aqui, tem duas coisas que são separadas. Quando eu comecei a ler algumas coisas para esta pauta, eu vi um negócio que eu achei bem interessante, conforme eu fui lendo, eu falei: “Nossa…! Mas isso superexplica muito as coisas que eu sentia”. Que é a Síndrome de Pensamento Acelerado. Vale muito a pena vocês procurarem. No Papo de Homem tem um artigo superbom sobre isso. Leiam. A gente vai botar na pauta. Mas o que é isso? É uma hiperconstrução de pensamentos em uma velocidade tal alta que estressa e desgasta o cérebro. É resultado do excesso de atividades e de estímulos sociais a que somos submetidos diariamente e impede o desenvolvimento das funções da inteligência, como pensar antes de reagir, expor e não impor ideias, exercer a resiliência e colocar-se no lugar do outro. Então, é uma sobrecarga no cérebro por excesso de estímulo, por excesso de informação que te deixa incapaz de fazer as funções básicas que normalmente você faria. Então, assim, alguns sintomas: ansiedade excessiva, irritabilidade, flutuação emocional, inquietação, intolerância a contrariedades, déficit de concentração, esquecimento, fadiga excessiva, cansaço ao desperrtarrrr. [risos]

(Bloco 5) 20’ – 24’59”

Ju: Se você se identificou com alguns ou todos desses sintomas, não se sinta mal, vem aqui nesse abraço quentinho. Estima-se que hoje provavelmente 80% dos indivíduos de todas as idades, todo mundo, não importa se você é aluno ou professor, se você é intelectual ou iletrado, todo mundo, pelo excesso de informação característico do nosso momento histórico do mundo que a gente está vivendo, está passando por isso. E aí eu acho que são essas as duas discussões que a gente está tendo. Como controlar o excesso de estímulo? Essa coisa que uma pessoa em média desbloqueia o celular 180 vezes no dia – é o tempo inteiro – para ver se tem alguma coisa nova, porque você está perdendo alguma coisa.

Ricardo Terto: Que não tem nada novo.

Cris Bartis: Virou o cigarro.

Ju: Só que o nosso hardware, nossa capacidade de processamento não funciona para isso, gente. Isso esgota, entendeu? E eu acho que é bem o que a Cris falou. Com o Mamilos, eu me senti mais pressionada a estar mais ligada, a estar sabendo mais, a ler mais. Antes eu tinha talvez uma leitura mais superficial das coisas (mais ou menos o que você falou, você está no Twitter, passou o olho, você sabe o que está acontecendo e isso já te basta), agora eu já me sinto responsável de entrar no link, ler, entender a polêmica, saber e tal. Já faz um tempo, acho que desde as nossas últimas férias, lá de janeiro, que eu estava muito esgotada. Eu fiquei muito cansada ano passado e eu não vi nada de notícia nas nossas férias inteiras. E eu li. Eu fui para ficção, para romance, para sair da realidade. Eu vi que isso me ajudou muito. Eu acho que é sensível para quem está ouvindo Mamilos, que vê no Meu Farol Aceso, não tinha livro há dois anos porque eu não dava conta porque eu lia muito internet, eu não lia muito livro, todo o meu tempo livre era usado pesquisando e coisa. Hoje eu estou dosando isso muito mais e eu acho que isso me ajuda até a ter distanciamento das coisas, sabe? Porque às vezes tudo é… Nossa! Sim, você mergulha, você põe uma lupa naquilo, aquilo é a coisa mais importante e você vai dissecar aquilo até o final. Eu vi que isso para mim não estava sendo bom. Uma coisa que para mim hoje é importante é filtrar quanto tempo eu vou me dispor, saber que o tempo é escasso, que a minha atenção é escassa e que a minha energia é escassa. Eu não posso saber de todas as polêmicas, eu não posso entrar em todas as polêmicas. Antes não acontecia, mas hoje em dia tem muita, muita polêmica que a galera fala, fala e eu nem estou sabendo. E a gente se sente mal. A menos que você faça uma escolha consciente, falar “eu não vou saber de tudo”… Imagina uma gaveta cheia de papel: você nunca vai encontrar o papel que você precisa. Se tem uma coisa que alguém gosta de arrumar sabe é que tudo que você descarta te ajuda a encontrar facilmente o que você realmente precisa. Quando você toma essa decisão em relação à informação, você não se sente mais mal de falar: “Eu não faço ideia do que você está falando.”. Aquele moleque do Acre, sabe? Bom, isso não me interessa. Não vou entrar em tudo isso e ler. Isso já não me interessa. Tal coisa: já não me interessa. Fulano brigou com sicrano: isso já não me interessa.

Oga Mendonça: O menino do Acre, um tuíte já te resolveria. Isso que eu estou pensando. Agora, o que eu acho mais complicado é assim. Eu participava de um coletivo (colaboro, mas não sou mais membro) que falava muito da questão da causa negra. Não deixei de militar, de ser do ativismo por causa disso, mas eu percebia o seguinte. Eu ficava brincando que eu falava assim: “Antes de alguém xingar um negro na rua, já chegava para mim a polêmica no Facebook.”.

[risos de todos]

Oga Mendonça: O cara começou a falar, já chegava, e já chegava com link: preciso saber sua opinião sobre isso. Eu gostei muito do que o Terto falou: “Cara, as pessoas vão sentir falta de mim.”. Eu também tinha essa sensação. “Preciso me posicionar porque é um ato político.”.

Ju: Essa é a segunda parte. Uma coisa é a informação que entra, a outra coisa é a informação que sai. Se a gente precisa se posicionar sobre tudo.

Oga Mendonça: Hoje em dia eu acho que eu não diminuí. Eu tive que repensar a minha vida interessa mesmo, de “onde você está botando sua energia?”, sabe? E essa energia é real. Como você pode mudar? Às vezes se você sair da linha de frente e ser um colaborador, talvez você não esteja ajudando mais efetivamente em várias causas? Eu diminuí protagonismo em alguns lugares para fortalecer o protagonismo em outros. E aí eu acho que o mais difícil é a gente ter essa noção sabe? De editar a própria vida. Eu acho que isso é muito difícil. É muito mais fácil a gente resolver o problema dos outros do que o nosso. Eu estou pensando muito nisso. Eu falo assim: “Cara, eu tenho certeza que eu sou um bom amigo.”, várias vezes eu ouvi as pessoas… Nossa… que presunção… [risos de todos] Mas eu sei. Eu tenho muita pessoa que fala: “Puta! Eu adoro conversar com você.”. [Cris Bartis: Eu adoro conversar com você.] “Nossa! Parece muito fácil.”. Só que eu falo: “Cara, por que para a minha vida não é?”. [risos de todos] Eu sei que todo mundo faz isso. E aí eu falei: “Cara, eu tenho que aplicar, eu tenho que imaginar.”. Então, em alguns momentos muito malucos da minha vida, eu projeto um Oga fora de mim e falo: “Cara, o que o Oga me falaria nesse momento?”. [risos de todos] Porque, cara, eu fico puto às vezes. Às vezes eu sou muito ruim, e eu tenho que respirar muito para perceber. Aí eu percebi que esse excesso de compromisso… E eu nem falo só o virtual, mas sociais mesmo.

(Bloco 6) 25’ – 29’59”

Oga Mendonça: Eu sou de São Paulo, minha família mora aqui, eu tenho seis irmãos, tenho sobrinhos. Cara, se eu deixar, todo final de semana tem uma festa. [risos de todos] Cara, como eu vivo nisso? Como eu veja as minhas séries? Como eu leio os meus livros? Que tem pilhas de livros. Eu voltei a ler muito, tipo, sério. Aí eu comecei a criar estratégias. Eu almoço muito sozinho. Eu trabalho em casa, vou almoçar e sempre vou com um livro. Eu falo: “Cara, almoço é para ler.”. [Ju: Idem.] “Desliga a porra do celular.”. Não todos os dias. Tem três dias da semana, “pô, já li três dias, então este eu vou ouvir um podcast, este eu vou ver um Master Chef” (que é uma coisa bem estúpida: assistir Master Chef no almoço).

Cris Bartis: São bem boas essas válvulas de escape.

Oga Mendonça: Você tem que criar estratégias. Eu falo assim: zonas atemporais para consumir conteúdo sem interrupções.

Cris Bartis: A minha última válvula de escape, que eu estou amando, é RuPaul’sim Drag Race. [risos de todos] Amo! E assisto com a Tatá, que fica muito enlouquecida com aquilo. Eu percebo e eu acabo… eu leio mais do que eu posto, mas eu quando acontecem grandes polêmicas que mobilizam a minha rede, que eu vejo a maioria das pessoas conversando, muitas vezes eu até me preocupo com as pessoas. “Meu, olha a energia que essa pessoa está empregando nisso.”. Ela faz um post, que gera um comentário, que gera outro, vem gente, xinga ela, ela responde a pessoa, vem outra, outra e outra, a hora que vai ver tem lá 500 comentários, onde ela interagiu com 100, tem gente xingando, gente apoiando. [Ricardo Terto: Eu sei exatamente como é isso. [risos]] Eu imagino que vá muita energia aí. [Oga Mendonça: Mas tem gente que gosta disso.] Eu gosto muito de escrever. Eu gostaria de escrever mais. Eu só não entendo que redes sociais sejam um ambiente para colocar tudo isso porque eu acho que as pessoas não partem muito do pressuposto de ler, de ouvir. [Oga Mendonça: O Medium.]

Ju: Falando dessa segunda parte, de tipo: “O que você coloca lá, de o que escolhe”, eu acho que para mim, daquelas férias do Mamilo, que eu fiz aquelas maratonas de podcast de neurociência, quando eu entendi como as pessoas reagem, como é difícil você mudar de ideia, eu falei assim: “Cara, a plataforma para eu fazer as pessoas refletirem é o Mamilos. É uma hora e meia de conversa que não tem argumentos só, tem uma voz que você se identifica, tem um relacionamento que é ‘pô, eu gosto dela’, ‘mesmo quando eu não gosto da opinião dela, eu gosto dela’, e isso já torna mais fácil a conversa, já torna mais fácil eu parar para refletir.”. Existe um ambiente quase como uma oração: “Eu entrei aqui, botei o Mamilos para tocar, então eu já me predisponho a ouvir.”. Essa é a plataforma que eu acredito que rola. Quer se posicionar sobre alguma coisa, quer fazer refletir? Essa plataforma eu acredito. Agora, o meu textão, o meu meme não vão fazer isso. Eu não acredito mais nisso, sabe? Eu não acredito que eu vá conseguir convencer as pessoas na rede social. Eu passei a postar muito, muito menos depois que eu fiz essa reflexão. Aí eu vejo as pessoas angustiadas cobrando. Elas cobram da Cris [Bartis], cobram de mim, cobram do Mamilos. “Fizeram tal coisa. Cadê sua carteirinha de feminista? Você não vai entrar com uma voadora?”. Tem coisas que eu acho que honestamente não precisa ir todo mundo em cima daquela polêmica, tem coisas que eu acho que, putz, a discussão não deveria ser por aí, não deveria ser dessa forma e tem coisas que eu priorizo energia, sabe?

Oga Mendonça: Às vezes alguém já deu uma boa resposta também.

Cris Bartis: Eu acho que às vezes tem gente muito mais habilitada para falar aquilo do que eu, sabe? Com mais energia até do que eu.

Oga Mendonça: Muitas vezes tem isso mesmo. “Cara, já me sinto contemplado aqui.”.

Ju: Aí você dá o retuite. Beleza. Seguinte, você quer saber a minha opinião? Retuíte. Pronto.

Oga Mendonça: Mas retuíte, uma coisa que todo mundo já retuitou, que foi isso que eu comecei a perceber: “Eu só estou floodando a rede dos outros.”.

Ricardo Terto: Não é tanto novidade assim. Não é porque.. O número de informações é grande, mas é muita informação repetida. A pessoa abre a geladeira, vê que não tem leite, fecha, daqui a dois segundos ela abre para magicamente aparecer um leite.

Ju: Um exemplo foi o cara da ejaculação do ônibus, que todo mundo falou: “Vamos falar sobre isso.”. Gente… Mas é sério? Eu sei que, pô, isso está acontecendo todos os dias, então é um assunto sério. Eu concordo. [Oga Mendonça: Lógico.] Mas a minha contribuição é: não ejacule no ombro das pessoas no ônibus.

Ricardo Terto: Galera, seria legal aí se vocês começassem a…

[risos de todos]

Oga Mendonça: Sobretudo a gente consegue achar um tema. A gente pode discutir.

Cris Bartis: Tem coisa que não rende. Tem coisa que é factual.

Ricardo Terto: Posso falar o calendário das tretas?

Cris Bartis: Fala, que eu adoro, que é maravilhoso.

[risos]

Ricardo Terto: Teve uma moça, Suzane Jardim, que ela fez um calendário das tretas. Fizeram uma compilação. Eu vou ler aqui. Você vê que todo ano em determinadas datas surgem as mesmas tretas e dos mesmos assuntos, que este ano vai ser a mesma coisa. Vá anotando aí, viu? [risos de todos] [Cris Bartis: Para gritar “bingo!”.] Cuide para não perder.
Treta odeio carnaval x amo carnaval: Se você não gosta é um elitista que odeia cultura popular e pobre. Geralmente iniciada no fim de janeiro e segue por todo fevereiro.
Treta do dia da mulher: “Não quero rosas, quero respeito” x “Quem reclama de rosas é a branca padrão pois as mulheres não-padrão nunca receberam rosas, quero rosas SIM e se reclamar eu ganho é duas!”
Treta do dia das mães: “Mãe pode ser abusiva, parem de romantizar a maternidade” x “Mãe não pode ser abusiva, parem de culpabilizar mulheres”. Ou variações da interminável treta das “mães de pet”.
Treta das mudanças de estação: Ocorre duas vezes por ano, geralmente na chegada do verão (“verão opressor”) e na chegada do inverno (“inverno opressor”).
Treta das estreias de novas temporadas de séries: “Dou spoiler e foda-se” x “Quem dá spoiler me exclui”.
Treta do dia dos pais: “Não desejem feliz dia dos pais pras suas mães, isso é naturalizar o abandono paterno e a dupla função da mulher” e variações: “Pais não merecem parabéns”, etc.
Treta das eleições: Geralmente de dois em dois anos. Inicia logo que os pré-candidatos são escolhidos e segue por meses com diversos textões sobre o assunto.
Treta do concurso de Miss Brasil: “Representatividade importa” x “Concurso de Miss opressor para de bater palma pra manutenção do padrão de beleza”. [Ricardo Terto: Isso aconteceu esse ano].
Ricardo Terto: Treta dos homens famosos morrendo; Treta da Copa; Textões dos festivais caros pra caralho; Textões das datas históricas… O próximo vai ser Halloween. Não percam.
Cris Bartis: “Acabando com nossa cultura x O mundo é globalizado”.

Ricardo Terto: E tem vários. Tem dia das crianças, Enem, todo ano é a mesma coisa.
Cris Bartis: Os atrasados do ENEM.

(Bloco 7) 30’00” – 34’59”

Ju: Eu até vou falar porque alguém vai entender errado. Não é que eu não ache que ninguém deva discutir o cara no ônibus. Claro que ele tem que ser discutido! Acontece que eu já discuti, eu já passei dessa fase da discussão. Eu já discuti isso, eu tenho programa sobre isso, eu já cansei dessa discussão per se assim, sabe? “Juliana, mas o mundo não está resolvido.”. Tudo bem. Eu vou contribuir de outra forma, entendue? Eu não vou contribuir dessa maneira. Tem outras pessoas que contribuem.

Cris Bartis: Tem gente que contribui. Tem boas pessoas…

Ju: Segue em frente. Tem outras tretas, sabe?

Oga Mendonça: Eu acho que legal ter citado a Suzane. A gente participou de um projeto junto, a Suzane principalmente supertopou. [Ju: Era sobre tretas? [risos]] Não, era sobre Rafael Braga. [Ju: Isso me mobiliza.] Uma coisa que me irrita mais sobre a polêmica da semana é isso. O Rafael Braga continua preso, só que aí tem a polêmica da semana, todo mundo discute aquilo e ninguém volta naquilo e aí as coisas continuam. Só que aí tem a próxima polêmica. [Ju: Fica superficial, né?] Que aí eu entendo muito o que o Marcio Black fala, que é verdade. Quando você vai para a rua, tipo a Cracolândia ainda está lá, ainda é um problema, já teve vários desdobramentos, mas o olhar da mídia vai para longe disso. E agora as redes sociais pautam a mídia. Então fica um jogo muito bizarro. Você fala assim: “Cara, eu não estou sendo honesto com nada.”.

Ju: Você não se compromete com nada porque tudo é amor de verão.

Oga Mendonça: É. Você tem uma resposta ali, você briga. O meu primeiro momento foi aquele de falar: “Cara, você não vai me pautar.”. Tipo o caso da Malu. Várias pessoas me chamaram para discutir apropriação cultural em cima do caso da Malu. Não. Eu não vou ser pautado pela Malu Magalhães, cara. Ju: Sensacional.] Porque a gente já está discutindo essa discussão há muito tempo. Não vai ser ela que vai me pautar. Aí depois você vê um caso parecido de um grupo de rap branco que entrou em um festival. A mesma coisa: cara, eu não vou ser pautado por esses caras. Você quer ler sobre isso? Tem esse, esse, esse e esse link. São incríveis. Mas não me bota essa pressão. Esse assunto não vai ser esquentado por isso, tem que ser uma coisa mais legítima e eu tenho que acompanhar o final, o desdobramento. Discussão sobre slow journalism, que é um pouco isso. Cara, a gente não precisa falar do assunto no momento, vamos acompanhar até o final, vamos ver o que aconteceu, vamos dar um report. Não existe mais isso.

Cris Bartis: A gente já fez essa escolha várias vezes. O ápice da polêmica, a gente: “Cara, tem muito pouca informação ainda. Vamos esperar mais um pouco que aí a gente consegue trazer algo mais substancial.”.

Ricardo Terto: Tem um coisa que o Oga falou, de “eu não vou deixar que isso me paute”, que é uma coisa assim. Em algum momento, a gente vai ter que abandonar esse tipo de hábito, que eu acho que a gente talvez esteja também na primeira infância da coisa, mas eu percebo muito que as pessoas pegam pequenos exemplos… E a gente tem que entender que, quando a gente posta, nós também somos personagens, nós estamos vivendo na verdade uma ficção ali. Você pode ver, uma pessoa que está lá dando risada, KKKK [Oga Mendonça: Você é um avatar.], você vai ver a cara dela, ela está superséria, mas está achando aquilo superengraçado.

[risos]

Ju: Você postou uma coisa sobre isso.

Ricardo Terto: Não lembro… Acho que foi outra pessoa.

Ju: Não. Não foi você… Foi o…

Ricardo Terto: Tony Marlon.

Ju: Foi o Tony.

Cris Bartis: Que é ótimo.

Ju: Muito bom esse texto dele. Eu fiquei pensando sobre isso.

Ricardo Terto: É ficção também.

Cris Bartis: “Eu estou rindo por dentro.”.

[risos de todos]

Ricardo Terto: A pessoa está rindo por dentro. Às vezes (eu já vi muito isso acontecer) a pessoa pega um print. Por exemplo, uma notícia no G1, tem um print de alguém falando uma bobagem muito grande. Aí a pessoa printa aquele comentário e fala: “Está vendo? É assim que as pessoas estão pensando. Isso é o brasileiro. É o homem.”. [Oga Mendonça: Começa a trabalhar com estereótipo.]

(Bloco 8) 35’00” – 39’59”

Ricardo Terto: E começa a trabalhar em cima daquele exemplo ali.

Cris Bartis: Igual à Terra plana.

Ricardo Terto: Igual à Terra Plana. Sendo que tem cem outros comentários e às vezes, aquele mesmo comentário que é esdrúxulo, ele tem duas curtidas e cem negativados, sem para baixo, mas aquilo, porque está em um print, vira [Cris Bartis: Fato.] “como as pessoas são” e tal. Isso eu acho que aumenta a toxicidade, sabe?

Ju: Uma coisa que eu queria resgatar do que você falou também, Oga. O Rafael Braga é uma coisa que me move muito ainda e, toda vez que eu vejo passar, eu falo: “Não é possível que a gente ainda esteja discutindo. Caralho! Se todo mundo já falou disso…”. Se você fala que a mídia social pauta a mídia, a mídia pauta o poder… Por quê? O que está acontecendo? A gente já deixou claro milhares de vezes o que a gente pensa: “isso é um absurdo”, todo mundo fala que é um absurdo, ninguém contesta que seja um absurdo. Por que isso não se move? Aí eu acho que o segundo step dessa questão de se posicionar para tudo é assim: a apatia do “que diferença faz?”. Beleza. Das coisas que eu realmente me importo, que eu me informo pela internet, eu estou muito mais preocupada hoje de entender que, cada vez que você faz um barulho gigante e nada muda, menos você acredita que você tem poder, que você tem voz, e eu acho isso muito perigoso. A gente vai se esvaziando, se esvaziando de propósito, se esvaziando de fé, a gente vai ficando mais cético, mais cínico.

Cris Bartis: Mas eu acho que a gente tem exemplos bem contrários disso também, Ju. Eu acho que principalmente no movimento feminino, no movimento negro tem bastante também, quando as mulheres falam “meu corpo não é público” e toda a reação que as mulheres tiveram depois desse último caso esdrúxulo, o quanto isso repercutiu, o quanto isso virou pauta para a mídia, muitas vezes o movimento negro falando da representatividade, o quanto isso tem a duras penas se modificado. O ativismo de redes sociais ganhou um respaldo muito forte hoje em dia. A gente vê programa político sendo feito em cima do que está sendo falado em redes sociais. A gente fala daquele ciclo: as pessoas falam, depois elas desfalam até chegar na Ana Maria Braga. [Ricardo Terto: Ou na Fátima Bernardes.] [risos] O caso do Rafael Braga eu acho que é uma ponta muito fora da curva de uma loucura que a gente está vivendo hoje em dia, acho que ele representa muita coisa. A gente falou sobre ele de novo na Newsletter #2 porque de novo aconteceu. Vocês sabem o que o caso do Rafael Braga me faz lembrar? O Hurricane [Rubin Carter], aquele boxeador negro nos anos 60 que é preso injustamente e passa mais da metade da vida dele preso, perseguido. Cara, tudo que eu leio do Rafael Braga, eu lembro do Hurricane. Tem um filme do Denzel Washington [The Hurricane], que faz o papel do Hurricane, que é incrível. Assistam. Para mim é aquela história ali, um ser humano que representa tudo que é injusto no mundo.

Ju: Por isso que eu tenho essa dificuldade. Um dos programas mais difíceis que a gente fez foi sobre o sistema prisional. A gente sabe que isso acontece aos montes. Mas ele é um símbolo. Quando todo mundo está consciente: “Você não pode fazer isso na minha cara”, “Você não tem o direito de fazer isso na minha cara”, todo mundo sabe, está às claras, todo mundo se posicionou e nada acontece, feijoada, sabe? [Oga Mendonça: Esse é o meu meme predileto] [risos de todos] E aí você se sente muito impotente. Eu acho que é a mesma coisa de, por exemplo, um escândalo de corrupção por semana, porque daí você fala: “Atingimos um novo patamar.”. [Cris Bartis: Desbancado pelo próximo desdobramento.] Atingiu a meta.

Oga Mendonça: Sempre vai anestesiando a gente. Eu estava brincando com um amigo meu. E se a gente fizesse passeata com gritos de coisas que podem acontecer? Tipo “Fora, Temer”, ele sai, “Não vai ter Copa”, ele sabe que vai ter. [risos] E se você tivesse uma passeata com manifestações honestas? “Fora, Temer… em 2018”. Ricardo Terto: “Fora, Temer, em 1° de janeiro de 2019”.] [risos de todos]

Ju: Não faz isso porque daí ele pode se eleger de novo só por causa disso.

Cris Bartis: Ele não pode. Menos mal.

Oga Mendonça: Mas eu entendo muito o que a Cris fala. Eu acho que a gente já está no segundo momento, gente. As redes sociais têm um peso e influenciam na nossa vida real. Só que eu acho que a gente está em um momento de falar “não só isso”, “não só as redes sociais”. Tem várias coisas que me confundem ainda. Estou formulando a tese com vocês, tá? [risos de todos] Estão aqui na minha mão. Agora no mercado de trabalho a gente tem realmente muita gente. Eu odeio esses cortes geracionais, millenials e tal, mas eu vou usar (longa história de por que eu odeio esses cortes geracionais).

Ju: A gente pode fazer um Mamilos sobre isso.

Oga Mendonça: Podemos. Eu vou adorar participar. Mas eu acho que agora tem uma molecada que realmente não viveu esse mundo offline e que acredita muito no poder porque tudo que eles pediram nas redes sociais aconteciam. Então eles não conseguem separar a vida deles disso. Nós da geração da transição, que nem eu, eu nasci em 79…

(Bloco 9) 40’00” – 44’59”

Oga Mendonça: Obviamente eu estou muito mais próximo do millenial. Eu gosto das redes sociais, eu sei usar elas todas, já consigo pensar com moderação porque eu acho que elas me atrapalham, mas eu ainda acredito muito nesse ativismo da vida real, de sair na rua. Você quer brigar com o Rafael Braga? Você tem que entender de lei, cara, você vai ter que ter um amigo advogado. Um outro nível de envolvimento. Às vezes eu acho que tem um pouco da cultura do lacre, de você receber o biscoitinho, de você dar respostinha, de botar os óculinhos pretos que eu acho que às vezes deixa tudo meio bobo, deixa meio fugaz demais. Como a gente faz para levar isso para a rua? Como a gente faz para levar essa inteligência das redes sociais, esse superpoderoso que eu sou das redes sociais “porque eu consigo dar um Google”, “eu pego uma citação muito rápido”? Como eu faço para fazer isso na rua? Como eu faço para não ser um truque na vida real? Isso que eu acho complicado.

Cris Bartis: E se a gente fizer uma passeata fantasiados de meme?

[risos de todos]

Oga Mendonça: Acho que vai ajudar.

Ju: Eu já pensei do Rafael Braga assim: entender quem é a pessoa que realmente está articulando para fazer alguma coisa na vida real. Por exemplo, a Rebecca Lerer é uma pessoa que eu respeito um monte. Eu quase sempre pergunto para ela: “Rebecca, o que a gente pode fazer para de fato ajudar?”. É aquela coisa, em vez de você estar falando, você vai somar. Tem uma galera que está tentando um recurso assim, assim e assado; a gente precisa de assinatura para não sei o que. Então o Mamilos pode se posicionar dessa maneira. A gente vai para o ar e chama todo mundo: “Gente, isso aqui é sério. A gente não compra qualquer briga. Essa briga a gente está comprando. O que a gente precisa é assinatura. Assinem agora!”. Ou “Não, o que a gente precisa é de gente. Ficar fazendo barulho na internet por ele já não ajudou.”. Eu acho que isso é bonito na internet, que ela descentraliza, todo mundo pode ter uma opinião, mas, na hora que você precisa de algumas pautas concretas, às vezes você precisa centralizar de novo, você precisa coordenar os esforços e ir potente para um fim só, entendeu, todo mundo na mesma direção, na mesma intenção, no mesmo momento, porque senão fica só barulho. O que eu sinto é muito ruído branco, sabe? Todo mundo vai lá, coloca “Rafael Braga” e tal, mas nada acontece porque você não conseguiu canalizar essa força, essa fúria, essa indignação para uma ação.

Oga Mendonça: Sim. Às vezes essa colaboração é mais prática. A Suzane mesma é uma das meninas que estava organizando o 31 Dias para o Rafael Braga. A minha colaboração mais efetiva foi fazer logo, sabe? Foi o que eu pude fazer naquele momento (obviamente eu me informo e tal), mas na verdade o que a galera precisava era de dinheiro também. A gente fez festa para arrecadar grana e mandar. Na maioria das vezes o que as pessoas precisam são coisas do mundo físico e real: grana e gente para trabalhar. Grana e o seu tempo. E aí que é foda. Eu percebi assim. Eu sou um cara envolvido nisso, esse assunto me dói muito e meu tempo… cara, vai ser um logo, vai ser o que eu posso. Mas eu acho que é melhor do que eu ficar passando 15 mil shares de textos incríveis porque as pessoas não vão ler porque elas também não têm tempo. É muito difícil.

Ricardo Terto: Mas ninguém vai curtir o meu tempo. Ah…

Ju: Qual biscoitinho eu vou ganhar por ter dado o meu tempo?

Cris Bartis: Eu amei esse meme do biscoito. Deixa eu comentar uma coisa com vocês aqui que eu acho superinteressante a gente falar do over compartilhamento. Mas tem uma coisa que a gente fala aqui no Mamilos: se você se posiciona para o bem, o mal não se perpetua. Onde se põe luz, não se faz escuridão. Eu acho que o poder também das pessoas irem lá e falar “eu não compactuo com isso” também fomenta uma discussão muito viva hoje em dia. Você saber que o seu chefe não compactua com a exclusão de homossexuais, ele está deixando uma mensagem muito clara ali, é um gesto. [Ju: Ele se posicionar.] Esse “se posicionar” é do mesmo que a gente estava falando sobre tolerância, que, quando o cara fala “eu defendo a supremacia branca”, ele está se posicionando. Quando esse cara faz isso, a rede conhece esse cara e enxerga ele de uma determinada forma. É paradoxal, mas, ao mesmo tempo em que postar tudo e se posicionar sobre tudo é extremamente cansativo, tem uma energia, tem um desgaste, se posicionar também é deixar claro para a comunidade quem é você, o que você pensa.

Ju: Mas você tem que escolher suas batalhas. [Oga Mendonça: Você tem que trabalhar seu branding, quem é você.] Excesso de informação gera pobreza de atenção. Por que eu não falo sobre tudo? A hora que eu falar, as pessoas vão escutar. Eu acho que é um pouco do que o Terto trouxe. “Você se posiciona”, mas é todo mundo se posicionando do mesmo jeito, então as pessoas lêem um monte de coisas similares. Existe um trabalho, acho, de curadoria e de pensar que você faz parte de uma rede. Você não precisa fazer tudo, tem pessoas fazendo. Existe uma jornada, um momento. Se há um ano fazia sentido me posicionar sobre todas as coisas, tem gente que está passando por essa jornada hoje, e ótimo, que bom, isso faz parte, isso é saudável.

(Bloco 10) 45’00” – 49’59”

Ju: Eu acho que entender que você não está se omitindo quando você não quer ler sobre tudo e se posicionar sobre tudo existe porque justamente você entende que as outras pessoas estão lendo, estão fazendo, estou indo atrás. Existe em um contexto em que a sua opinião existe junto com a opinião de uma galera também.

Ricardo Terto: Eu sempre tive uma imagem do Facebook muito parecida com a do Mario Kart, sabe? [risos] Já jogaram? Tem aquela partezinha que você passa em cima de um negocinho colorido e dá um gás, um turbo, alguma coisa assim [Oga: Isso]. Eu sempre imagino que a conversa sempre começa com as pessoas se posicionando, às vezes não tem muita repercussão, até que chega em pessoas que são pessoas turbo, elas potencializam o assunto e o assunto começa aí a se multiplicar. As pessoas turbo multiplicam o assunto não por causa (vou falar, mas talvez possa estar falando uma besteira aqui) do assunto em cima, mas porque as pessoas estão falando do assunto, então ela sabe que aquilo vai ter uma repercussão porque as pessoas vão ler, curtir etc. e você pode usar isso para que esse assunto tenha uma relevância. Só que eu acho que em algum momento todas as polêmicas, quando começam a subir muito, fica para trás a Rebecca ou a Suzane, que eram pessoas que poderia ter coisas para falar mesmo a respeito disso, que ficam meio que para trás e de repente vem uma banana com o Mario girando. [Oga Mendonça: Total.] Elas batem ou alguma coisa assim. [risos de todos]

Ju: Se perde, né?

Ricardo Terto: Se perde em algum momento. Eu acho que é importante ter as pessoas se posicionando lá embaixo, na base com seus cem amigos, acho legal quando pega um turbo, mas em algum momento tinha que ter uma forma de direcionar para quem realmente tem alguma coisa para falar sobre o assunto. Por exemplo essa coisa de textão, que talvez não tenha muita influência. Depende muito de quem vem. Na época da polêmica da Cracolândia, que todo mundo estava falando, eu li um texto muito legal de um cara que trabalhou lá por anos e anos. [Cris Bartis: Que a gente trouxe aqui.] [Ju: Foi!] Putz. Aquilo ali é… aquilo ali. [risos] E não…

Oga Mendonça: Mas você entende que esse textão não precisava existir só no Facebook? Ricardo Terto: Sim, sim.] Na verdade o que eu questiono é aquele post, mais do que compartilhar o texto, que a pessoa escreve três linhas da opinião dela, joga um textinho ali da notícia, que às vezes é uma notícia bem pequena, não é o textão de um cara que, puta, poderia escrever em uma revista científica ou poderia ser um pedaço de uma tese. Por isso que eu falo que eu não sou contra o textão, eu só acho que tenha os lugares para ele. O Medium para mim é um lugar que eu acho mais saudável, mais interessante para ler textão. Tem plataformas que eu acho que combinam mais. Às vezes só suprir minha informação, eu acho que o Twitter me ajuda muito [Cris Bartis: Eu gosto.] [risos] e todos esses newsletters. Acho que me ajuda a falar: “Cara, eu posso me aprofundar nisso.”.

Cris Bartis: Eu acho que nem tudo é tóxico. Eu gosto dos cronistas da vida real que nasceram a partir do Facebook. Tem gente que encara a vida por um viés, por um ângulo bem real e que de alguma maneira de informam, que de alguma maneira te divertem. O Terto é um cara que eu sempre leio porque eu acho que ele sempre traz um jeito de enxergar a vida. Eu nunca esqueço, o primeiro texto que eu li dele foi dos peixinhos que ele colocou em um balde. E aí eu me identifiquei porque eu tive uma infância parecida com a dele nesse tipo de coisa, e gostei dele, gostei da pessoa e fui seguindo. Então eu acho que nem tudo é tão pesado o tempo todo, e chato, e maçante. A Rebecca é uma pessoa que eu leio sempre [Ju: Eu também. Eu leio tudo dela.], tem sempre informação ali. Oga Mendonça: Sempre tem muita.] E tem gente que é muito piegas, mas belê, está lá também.

Ju: A gente nem está falando para você não ler o Facebook, é modo de consumir. É excesso de informação.

Oga Mendonça: É amplificar a curadoria, é editar sua vida. Eu acho que para mim um pouco o segredo é esse: você vai ter que editar, velho. Você vai ter que realmente olhar para coisas e falar: “Isso me interessa, isso não me interessa.”.

Cris Bartis: Eu vou gastar energia com isso?

Ju: Quanto de tempo? Quanto de atenção? Quanto de energia? É isso. Onde você se debruça, a coisa toma uma proporção maior para você. É muito fácil, como você está mexendo 180 vezes no Facebook, você achar que isso é um mundo. Então assim, no minuto que o seu celular dá pau, que você fica sem o Facebook uma semana e você vê que o mundo continua girando, você vê não que aquilo não tenha feito falta para você, não que aquilo não seja importante, não que aquilo não seja engraçado, não que aquilo não promova conexão, é só que aquilo não é tudo, aquilo é uma portinha. Você vai pensar em como você vai fazer todas aquelas informações virarem só uma parte do seu dia e não o seu dia, em como você vai fazer para aquela enxurrada de informação não te pautar, como o Oga falou.

Ricardo Terto: A gente precisa perder o medo de estar em uma bolha para ter ferramentas para romper essa bolha. É isso que eu ouvi muito ano passado, inclusive eu pensei muito sobre isso, “a bolha”, “eu preciso de gente que tenha opinião diferente”. Que tal andar por aí?

[risos de todos]

Ju: Que tal viver? Conversar com o porteiro, com o colega que trabalha do seu lado que arrota um monte de coisa diferente do que você pensa? Que tal conversar com o seu Tio com um pouco de paciência?

Ricardo Terto: Do Facebook você se nutre daquilo que é necessário. A vida real é a vida real.

[risos]

(Bloco 11) 50’00” – 54’59”

Cris Bartis: Essa discussão toda me faz lembrar muito do filme Her, com o Joaquim Phoenix, que foi um filme que chamou muito atenção porque eu comecei a assistir o filme achando que era um filme sobre solidão. “Puxa… Como esse cara é sozinho. Por isso que ele se apaixonou pela voz.”. Do meio para a frente, eu comecei a falar: “Como esse cara é egoísta e egocêntrico. [risos de todos] Ele se apaixonou foi por ele mesmo.”. Ele alimentou uma máquina que respondia a todos os estímulos dele, como ele gostaria e depois ele se apaixonou por ela. Então, na verdade, ele se apaixonou por ele mesmo. Eu acho que as redes sociais têm um pouco disso, têm um pouco de você se apaixonar por você mesmo, porque, como você está se alimentando do algoritmo, as respostas que vêm, elas confirmam muito o que você pensa. E aí você fala: “Eu estou certo. Sou legal. Olha o biscoito.”. E isso vai. Esse filme virou um símbolo muito forte para mim sobre o poder que tem esse autorreforço, que você acaba se apaixonando por você mesmo, [Ju: Narciso.] você começa a achar que você é legal demais.

Ricardo Terto: Agora o Facebook está com umas notificações que reforçam isso, uma coisa tipo: “Ah,você compartilhou seis vezes essa semana”. Virou um gamezinho. Uau!

Cris Bartis: “Seus amigos deram tantos likes no que você disse.”. Hoje eu coloquei um negócio útil lá […] computador, não tem ninguém lá me ajudando. [risos de todos] Quando eu coloco textão, todo mundo ajuda.

Oga Mendonça: Bota uma foto.

Cris Bartis: Eu preciso de um gato.

Oga Mendonça: Bota uma foto sua nova segurando uma placa: “Me ajudem.”. Eu acho que aí vai funcionar.

Cris Bartis: Aí funciona.

Ricardo Terto: O meme funciona para potencializar tudo.

Ju: Vocês sabem, esse é o próximo assunto.

Cris Bartis: Segura só um pouquinho. Antes de a gente passar para esse, eu queria falar sobre os grupos de Facebook, que são na minha opinião grandes espaços de construção de conhecimento.

Oga Mendonça: Sim. Eu acho que são as melhores partes. Principalmente coisas técnicas.

Cris Bartis: Gente, eu vou falar para vocês, não vou entrar muito, mas eu entrei em um grupo sobre um problema de saúde que eu tinha e não teve um médico que conseguiu me trazer tanta informação igual ao compartilhamento de outras mulheres dentro desse grupo.

Ricardo Terto: A resposta Watson aí.

Cris Bartis: Não, é muito louco. “Olha, eu fiz isso. Eu tenho esse mesmo problema, eu fiz isso e isso aqui deu certo para mim.”. Aí a outra: “Isso não deu, mas aquilo deu.”. “Tem esse médico aqui. Ele é muito bom. Vai nele.”. A outra: “Pô! Eu fui. Eu gostei.”. Tem uma construção colaborativa de ajuda absurda. Eu faço parte desse, tem um outro profissional muito legal também. Tem uns espaços de conhecimento e de troca muito forte dentro desses grupos. Eu acho um negócio fantástico. Gente que nunca se viu está em tudo quanto é lugar, [Ju: Trabalhando colaborativamente.] ajudando outras pessoas que têm as mesmas questões. Tem os grupos malucos de filho, tem os grupos de pornografia feminina, tem de tudo em grupo.

Ricardo Terto: Já pensou que muito louco são essas mesmas pessoas que, fora dos grupos elas são super…

Cris Bartis: “Oh… meu Deus…”.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Eu acho que é a mesma relação que a gente faz de você ser pedestre e ter o carro. [Cris Bartis: Isso!] Para mim é a mesma relação. [Cris Bartis: É “Senhor Volante” do desenho do Pateta.] Quando você está com o carro, você é uma coisa, quando você está a pé, você é outra. Você tem vários modais: pode andar de carro, de bike. Eu acho que é a mesma coisa. Eu acho que muito legal o que você falou, Cris. Eu acredito nisso. Às vezes a gente fica falando tanto da bolha, da bolha, mas comunidades dentro do Facebook são a superbolha, mas o propósito é o mesmo, então funciona.

Ju: O propósito está claro e o grupo só funciona para aquele propósito. Você não ficar discutindo sobre Dória com a menina que tem a mesma doença que você. Não importa a opinião dela sobre isso. A gente precisava demais conseguir extrapolar isso. “Como eu posso ser amiga de uma pessoa que votou no Dória? Bom, ela tem a mesma doença que eu e ela entende para caramba disso e ela não se resume a isso. E vamos embora, gente.”.

Cris Bartis: Exato. Nunca entre no perfil da pessoa. Aqui estou te dando uma dica.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Total. É isso, Ju. Porque dá esse lance da curadoria. Você já fez um recorte: naquela zona, qual Facebook, […]. Você fez um recorte. Eu estou na comunidade do Audiovisuando. Aqui só tem gente que faz audiovisual. Tem um cara que faz filme de casamento, tem o cara que faz cinemão. E está todo mundo discutindo alguma coisa muito técnica de uma câmera X. Também consegui informações incríveis. Eu falei: “Velho… Está aqui.”. Era a mesma coisa de Reddit e outras redes e fóruns.

Ricardo Terto: “Mas o Halloween…”. “Não importa!”

[risos de todos]

Cris Bartis: “Não importa. Se você gosta do Saci e eu da bruxa, está tudo bem”.

Oga Mendonça: Está tudo certo, velho.

Ju: A gente sai dessas bolhas de compartilhamento, que aí eu acho que é a rede social fazendo o que ela se propõe a fazer. Que beleza. Ela vai fazer isso superbem.

Cris Bartis: Nossa! Faz tão bem.

Ju: Ela quer te aproximar dos teus amigos. Então beleza. Isso ela vai fazer bem. Quando a gente vai discutir coisas sérias, uma das coisas que sempre é pauta dessa polêmica é que brasileiro transforma tudo em meme, [risos] Ele não consegue falar sério. [Cris Bartis: Líder mundial.] Vocês acham que isso esvazia a discussão ou tem o seu valor?

Ricardo Terto: Antes de tudo, eu quero falar o seguinte. A juventude…

[risos de todos]

Ju: Os jovens de hoje em dia.

Oga Mendonça: Ó o disclaimer.

Ricardo Terto: Os jovens hoje não consomem mais memes, eles conseguem mene.

(Bloco 12) 55’00” – 59’59”

Ju: Ai! O mene, gente! Eu sou.. eu vou confessar uma coisa no ar aqui. Eu tenho uma disfunção cognitiva que eu não consigo entender exatamente o mene. [risos de todos] Sabe? Então, o Merigo se diverte com isso loucamente. Primeiro, eu pesco poucos, na maior parte das vezes eu preciso da explicação para entender e eu vou confessar no ar que eu não entendo exatamente o conceito do mene, sabe?

[risos de todos]

Cris Bartis: Por favor.

Ricardo Terto: Faz parte disso.

Cris Bartis: Professor, explique o que é isso.

Ricardo Terto: [tom professoral] Bom. Vamos lá. O mene…

[risos da Ju]

Ricardo Terto:. O mene, diferente do meme, não é feito para se propagar, ele não tem uma narrativa, não tem uma piadinha, que é uma piadinha feita para as pessoas ficarem repetindo infinitamente aquilo, para virar uma coisa que sei lá, o MBL vai fazer. [risos de todos] Quanto mais pavê, tio-do-pavê for a piada, mais chance. É uma negação ao meme. O meme tem que ser superelaborado, divertido. O mene não. O mene é a Minnie desenhada.

Ju: O mene é uma maronada?

Ricardo Terto: Praticamente. [risos] É a Minnie desenhada do lado de uma saia curta e a saia dizendo “saia Minnie” e embaixo dizendo: “Aí está a Minnie Saia.”. Isso que é o mene. [risos de todos]

Cris Bartis: Que maravilhoso.

Ricardo Terto: O mene é uma negação na verdade ao meme e é uma brincadeira justamente por isso. O meme, conforme o tempo foi passando, começou a ser apropriado por políticos, marcas, etc. Todo mundo quer participar. O ciclo de vida dele também termina acho que no Fátima Bernardes ou no Tadeu Schmidt. E aí o mene não. O mene é aquela piadinha ali, você dá uma risada de uma coisa sem graça, uma coisa nonsense e vai embora. Eu acho que é a diferença entre as tirinhas que o Maurício Ricardo fazia no Jornal da Globo com Angeli, sabe? Eu acho que é uma diferença entre uma coisa e a outra.

Oga Mendonça: Não te incomoda, cara, esse cinismo tão grande? Sabe? Até isso no mene… Eu fico brincando. Para mim o mene… não o mene, mas a mesma lógica, agora tem o lance das tatuagens feias. As pessoas se tatuam com desenhos toscos. Velho, tipo… Eu acho tudo incrível.

[risos de todos]

Ju: O que está acontecendo?

Oga Mendonça: Me olhando como adulto de fora, eu acho tudo incrível. As pessoas fazem tatuagem porque elas querem se decorar, porque elas querem ter uma coisa bonita, que tem um significado [Cris Bartis: Eu vi uma menina que desenhou uma Mônica.], aí o filha da puta faz um Mickey todo zoado e ele acha incrível. Eu olho e acho maravilhoso, mas por outro lado eu falo: “Cara, não está sendo muito cínico também?”. [risos de todos] Esse cinismo às vezes me incomoda. [Cris Bartis: Quero Ser John Malkovich.] Às vezes é meio foda. Esse cinismo às vezes me incomoda, do tipo, meu, ninguém mostra de verdade o que é, sabe? Essa coisa do guilt pleasure já nem ser mais guilt pleasure. E aí você fica meio… Eu não consigo entender tanto o humor hipster às vezes, sabe? Você gosta ou não gosta desse cara? [risos de todos]

[Ricardo Terto: Você gosta ou não gosta de pagode?

[risos de todos]

Oga Mendonça: Entendeu? Você gosta ou não gosta de verdade? Porque eu não sei te dizer. Às vezes eu fico meio na dúvida se eu posso falar que eu gosto do primeiro disco do Katinguelê. Eu falo: “Eu gosto de verdade do primeiro disco do Katinguelê. Eu tô falando isso é real.”.

[risos de todos]

Cris Bartis: Mas é que tem coisas muito boas. Por exemplo, todos os signos representados pelo Raça Negra. [risos de todos] Eu assisto porque aquilo é muito bom. Aí canta um pedacinho de uma música, “minha Deusa”, é áries. Eu não sei nada de signo e nada de Raça Negra e ainda assim eu acho muito engraçado. Eu acho que o meme é uma válvula de escape das pessoas que sempre tentaram usar o humor como uma forma de ler o mundo. Inclusive esse programa que está acontecendo nessa semana. Esse programa inteiro é um meme [risos de todos] por causa do dinheiro achado num apartamento. Gente, não vamos falar nisso, a gente vai falar de meme.

Ju: Eu acho que eu peguei uns 20, 30 prints só de uma mãe no Twitter assim: “Tive a pachorra de printar o que foi notícia mesmo no meu Twitter e o que foi meme.”. Aí era assim: 30 memes para 2 notícias. Era essa mais ou menos a estatística. A discussão é: tudo perde a seriedade? A gente perde a capacidade de indignação porque a gente trata os assuntos como piada ou isso também é uma ferramenta para, tipo, ninguém tem saco para ficar falando de coisas sérias o tempo inteiro e o fato de a gente abordar através do meme dá mais vida longa e mais exposição para assuntos que são de difícil digestão. O que vocês acham?

Ricardo Terto: No caso de Charlottesville, teve gente que defendeu que não era legal levar para o caso da piada, do meme, que tinha que deixar aquilo sério, do jeito que estava. “Aquilo ali, aquele assunto especificamente não vamos zoar com isso.”.

Cris Bartis: Charlie Hebdo não deu like, né?

Ju: Mas é que ali é lá fora, aqui no Brasil acho que não sei se a gente não faria meme com isso. A gente faz meme de qualquer coisa.

Ricardo Terto: Quando chegou aqui, chegou como no ciclo de discussão entre nazismo, se é de esquerda ou de direita.

Cris Bartis: Não. Eu não acho que a gente faz meme de qualquer coisa, não.

Ricardo Terto: Mas eu não acho.

Cris Bartis: Não acho mesmo. Desastre que envolve vida de pessoas… No caso da Chapecoense, teve canal de comunicação que tentou entrar na onda ali para poder ganhar like e a galera vociferou em cima.

(Bloco 13) 1:00’00” – 1:04’59”

Cris Bartis: Tudo que é vida humana, eu acho que a gente é mais respeitoso aqui no Brasil. [Ju: Tem razão.] Mas, quando a gente é feito de otário… meu Deus! [risos]

Ju: É um humor autodepreciativo.

Cris Bartis: Eu fico imaginando que Tamires quando crescer vai falar: “Ai, mãe… Hoje foi um 7×1.”. Porque eu acho que a gente vai usar isso para sempre, sabe? Todo dia um 7×1.

Ricardo Terto: Mas o que é o 7×1?

[risos de todos]

Ju: Aprende em aula de história. “Teve uma vez…”. A Memepédia.

Cris Bartis: “Em um passado distante…”.

Oga Mendonça: Às vezes eu acho só complicado por causa disso. Eu acho que às vezes um meme, quando é bem aplicado, sintetiza e pode avançar uma discussão sim, mas na maioria das vezes não é. Na maioria das vezes ele finge que tem um nível na discussão, “eu sei”, “eu estou me informando sobre esse assunto”, “eu sei bastante coisa e eu quero trocar com você”, “a gente tem posições opostas”, “você não sabe muito desse assunto”, mas você não quer falar assim: “Oga, mas por que você pensa nisso?”. Em vez de você me entrevistar, pegar minha informação e me devolver como um contraponto, você me manda um meme supercínico, que fica aquele lance assim: “Parece que estamos no mesmo nível. Não estamos.”. Você finaliza a discussão, você bota uma barreira ali, “velho, eu já sei”. Por outro lado, uma outra provocação, voltando para aquele começo. Eu gosto do Twitter porque o Twitter faz uma curadoria ali embaixo, coisas que você precisa saber hoje, me dá a falsa sensação… aquele meu monstrinho que eu adquiri desse que eu trabalhei na Editora Abril, na Editora Globo, de consumir notícia vorazmente fica um pouquinho mais acalmado porque eu sei assim “está rolando furacão”, “está rolando esses assuntos”, “sei que está rolando tudo isso”, “posso me aprofundar em um, o outro, eu posso ignorar”. Cara, o meme de certa forma supre isso. Já chega uma piada, já chega naquilo e parece que “eu não preciso mais saber sobre isso, já vi 30 memes sobre essa merda, já vi a lista do BuzzFeed” (que aí é uma outra discussão).

Ju: Para mim mudou a ordem de informação. Por exemplo, essa segunda eu falei assim: “O que aconteceu no jogo do Flamengo?”. Porque estava rolando um monte de meme com o goleiro. Eu falei: “Eu não estou entendendo as piadas. Eu preciso entender.”. Não é “primeiro você sabe, depois vem a piada” é “primeiro vem a piada, depois vem a notícia”.

Ricardo Terto: Sim. Que até pegou mal para o Extra. As pessoas reclamaram da piada que eles fizeram com a capa do goleiro.

Ju: Eu não sei se a capa já tinha saído. A coisa é tempo real, né? Acontece o jogo e a galera já sai… O meme sai na frente do Extra.

Ricardo Terto: Sim.

Oga Mendonça: Olha que momento incrível, gente. Eu não sei o que é isso. Eu não vi. Eu ignoro. Futebol é uma coisa que eu ignoro. O que é? Me explica o aconteceu do Flamengo. Eu não faço a menor ideia.

Ricardo Terto: O Extra fez uma capa. O goleiro do Flamengo tem um apelido, Muralha, e aí eles fizeram uma capa porque ele tomou uns frangos lá, dizendo que eles se recusam a chamar ele pelo apelido de Muralha, ele é o Ex-Muralha.

Cris Bartis: Até que ele volte a ser digno do apelido. Estava bastante irônico. Só que aí o cara soltou nota oficial sobre isso, o clube soltou nota oficial. Deu um puta rolo.

Oga Mendonça: Ele levou uma piada a sério?

Cris Bartis: Muito.

[risos da Ju]

Oga Mendonça: Que isso é um lance do “putz… Ótimo! É o melhor caso.”. É isso. Você fica se posicionando: “Eu não sou muito tiozão de estar discutindo meme?”.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Aí fica esse cinismo que às vezes para mim é muito irritante. Eu falo: “Eu não sou tiozão. Eu me recuso a aceitar que eu sou tiozão.”. [risos de todos] Mas tem uns momentos que você fica: “Cara, eu estou tentando discutir uma coisa séria com você e você, filha da puta, está fazendo piada.”. [risos de todos] Então imagina que fica essa discussão. Eu imagino que o jornal tenha ficado um pouco nessa situação, tipo: “Cara, era só uma brincadeira.”. [risos de todos] “Você mandou a sua assessoria de imprensa defender o seu nome? Isso era só uma brincadeira.”. Só que toma uma proporção tão grande o meme que eu imagino que quem está do outro lado fala: “Cara… Isso não parece uma brincadeira. Olha quantas pessoas estão fazendo piada com o meu nome.”. Imagina! Coitado do Muralha.

Ricardo Terto: O meme torna fácil você esconder a sua vulnerabilidade sobre um assunto também.

Oga Mendonça: É isso. É esse cinismo que eu tenho medo.

Ju: Posso falar uma coisa? Eu acho que eu teria…

Oga Mendonça: Eu tenho medo.

Ricardo Terto: Eu tenho medo. Ó o meme.

[risos de todos]

Oga Mendonça: Eu já vi a Regininha.

Cris Bartis: Eu gosto da Nazaré.

Ju: Eu li essa semana o conto da Aia. Eu acho que eu teria uma opinião diferente nessa discussão se eu não tivesse lido o livro nesta semana porque eu estaria muito na sua linha, de falar: “Pô! A gente acabou ficando raso, interrompe a discussão”, me dá um sentimento de que eu já saquei a discussão quando eu não me aprofundo e tal. Mas tem uma importância gigantesca em meme, na ironia e no humor escrachado, principalmente das coisas sérias de político, de política, de pessoas que estão em estruturas de poder, que é o seguinte – de novo o Sapiens ajuda aí. Todas as construções humanas, o que você mais precisa saber para você colocar o seu poder é você fazer as pessoas esquecerem que isso é uma construção. Você precisa fazer com que todo mundo ache que a sua autoridade é uma coisa divina [Cris Bartis: Inquestionável.] e tal. O humor subverte isso. A partir do momento que eu posso fazer humor com você, você é humano como eu, você está sujeito a questionamento como eu. Você não é divino. [Cris Bartis: Tira o distanciamento.] E aí a gente vai conversar. Você vai ter que virar para a arena e sujar o pé para falar comigo.

(Bloco 14) 1:05’00” – 1:09’59”

Ju: É muito, muito, muito importante. Quando você faz humor com uma figura de poder, você tira o halo sagrado. Todos esses sistemas totalitários, você não pode fazer piada com um cara que está em um sistema totalitário. Tem todo aquele controle de imagem, ele só pode aparecer em determinados momentos, de determinados jeitos, não se pode falar tal palavra na frente dele. O cerimonial, o ritual para uma pessoa totalitária é muito grande porque o controle da narrativa todo é feito para que você saiba que ele não está no mesmo nível que você, que não existe conversa possível, que ele tem uma autoridade que emana dos ceús, ou da natureza, ou enfim, que é inquestionável, uma barreira intransponível. O humor quebra isso. No Conto da Aia, ela faz muito isso. Pequenas coisas que aconteciam no dia a dia que faziam uma pequena fissura nessa imagem que eles estavam querendo projetar, de infalíveis, de superpotentes e tal, isso tinha um poder de resistência. A realidade objetiva delas continuava sendo a mesma, de total submissão, mas dentro da cabeça delas eles já não eram mais tão poderosos por causa daquela pequena rachadura.

Ricardo Terto: Eu vejo assim também.

Oga Mendonça: Nossa! Eu sou o rei do contraponto. Agora, na posição do contraponto, eu vou me manter aqui, mesmo não concordando às vezes com o que eu quero dizer. Eu acho que a gente não pode se enganar de achar que o humor é a única ferramenta. [Ju: Não. Não única. Imagina.] Mesmo você falando do Conto de Aia, do Handmaid’s Tale, quando elas agem no mundo concreto e real, elas conseguem subverter um sistema dentro deles quando elas não jogam a pedra. Acho que eu não dei spoiler aqui.

Cris Bartis: Quando elas não agem conforme se espera que elas ajam.

Oga Mendonça: Eu só fico com medo. É meio complicado ser só uma estratégia.

Ju: É que você nunca vai vencer um sistema só com uma estratégia. Claro que não.

Oga Mendonça: Eu não acho que seja só humor. Para mim é muito claro isso. A gente tem sociedades que se organizam de formas diferentes. Eu entendo que o padrão de humor francês é muito diferente do brasileiro e muito diferente do inglês. Por isso que eu acho que a gente se adequou muito a esse humor do meme, ele funcionou muito para a gente. O Monty Python opera de uma outra forma, o Porta dos Fundos é outra coisa. Eu só acho meio complicado porque a gente joga uma coisa em cima do humor, só que o humor tem uma coisa que eu acho que muito cruel: ele humaniza tanto que você começa a ficar com dó do cara. Se todo mundo ridicularizar uma pessoa, você começa a achar ela humana, depois você começa a achar que ela é menos opressora do que ela é porque você está rindo daquela imagem. Isso me assusta muito.

Ju: Tira o teu temor daquilo porque parece que não é tão sério, tão grave.

Oga Mendonça: A gente está falando de meme, mas tinha vários memes racistas de verdade. Por isso que às vezes eu acho complicado. “Hoje é dia de preto e aí tinha um preto fazendo alguma coisa.”. Tem umas coisas que eu falo assim: “Cara, esconde uma coisa tão cruel.”. Quem faz esses memes é um cara branco que tem um computador? Sabe? Geralmente quem tem o poder de construir essas imagens, quem é o dono da narrativa é o opressor ou está muito mais próximo do opressor. Às vezes eu fico meio com medo dessa questão do humor, sabe? Os humoristas de Stand Up, a grande maioria são brancos e classe média alta. E esse cara faz humor. Eu falo: “Velho, alguém está vendo humor nesse pobrinho?”. Que aí eu começo a sentir que… Gente, eu não sei se é de verdade. Quem tem mais poder para propagar essas manifestações geralmente é quem tem mais grana. Gente, é por isso que eu falo, não é uma resposta fechada. Entendo que tem vários pontos. [Ju: Uma coisa não invalida a outra.] Mas eu acho que é isso. Às vezes eu fico meio com medo de jogar na conta do humor.

Ricardo Terto: Acho que tem esse risco. No meme é muito comum você ver uma pessoa sendo ridicularizada e às vezes ela nem sabe que está sendo ridicularizada, um vídeo.

Cris Bartis: Uma Gretchen, alguma coisa assim.

Ju: Total.

Ricardo Terto: Agora, o que eu também percebo – para você ver como é complexo esse caso – é o seguinte. O humor, o meme é uma forma. Você está em um país que você não sabe muito bem no que acreditar, em quem acreditar e em qual história acreditar. De repente você tem a necessidade de participar do assunto. Na real a gente está lidando com os nossos próprios sentimentos sobre um assunto, a gente está se sentindo mal, primeiro a gente quer resolver essa sensação ruim, “estou me sentindo indignado” [Ju: Impotente.], mas é uma forma de você participar de um assunto sem você ter lido todos os livros a respeito ou sem ter visto todos os links. Você tem que necessidade de participar do assunto; é uma forma fácil, sabe? O que é o meme? O meme é o 11 verdades 1 mentira. O Oga vai contar 11 verdades e 1 mentira sobre ele, aí a Cris também sobre ela, eu também sobre mim. Quer dizer, eu estou participando do assunto. E aí eu acho que é uma faísca, sabe?

Cris Bartis: Eu concordo muito com você. Para mim meme sempre vai ser a democratização do assunto. Esse assunto não chegaria em formato de texto, vídeo, nada sério para a pessoa, mas ela vai chegar em formato de meme.

(Bloco 15) 1:10’00” – 1:14’59”

Cris Bartis: O que a Juliana brincou do jogo do Flamengo, eu acredito que aconteça com várias pessoas com situações bem mais sérias. A pessoa que nem sabia nada do dinheiro encontrado do apartamento começa a ver um tanto de meme que ela fala: “O que é isso?”. E ela acaba vendo. Então eu acho que ter uma democratização em um país onde a escolaridade é tão maluca, que a gente tem tanto problema de escolaridade, o meme ajuda no processo de reflexão muito interessante. Este programa é um bate-papo, mas eu acho que tem uma antropologia por trás disso, tem uma economia comportamental por trás disso, tem o que você ri, o que te consome e o que você está consumindo. Tem bastante história aí.

Ju: Vamos encerrar a discussão, embora o papo pudesse render mais, e vamos para o Farol Aceso?

Cris Bartis: Bora lá.

[sobe trilha]

[desce trilha]

FAROL ACESO

Cris Bartis: Vamos então para o Farol Aceso. Vamos começar com o Terto. Migo, o que cê indica?

Ricardo Terto: Gente, eu vou indicar uma série muito legal que eu assisti no Netflix. Se chama Atypical.

Ju: A gente falou dela semana passada. Que bom!

Cris Bartis: O que é?

Ju: Mas eu não consegui indicar porque eu só assisti dois episódios. Então, agora introduza-a propriamente.

Ricardo Terto: É uma série nova, acho que colocaram na semana passada, que fala do ponto de vista de um garoto que tem um tipo de autismo. A série não fala exatamente que tipo de autismo ele tem, mas é um que eles classificam como ele ter alta performance. É uma série que a gente fala: “Putz… Será que eles vão conseguir dosar ao mesmo tempo sem estereotipar”? Porque tem aquela coisa do gênio, da pessoa que tem alguns descontroles, e ser um produto que [Ju: …seja entretenimento] seja entretenimento interessante. E é muito boa a série. A série é sensível, inteligente, tem um elenco muito bom, tem a Jennifer Jason Leigh, que concorreu ao Oscar, uma puta atriz, tinha feito Monalisa. Recomendo muito essa série porque ela é uma introdução empática ao assunto, interessante e que funcionaria se não fosse sobre o assunto especificamente, mas, por ser, eu fico muito feliz em saber que alguém conseguiu ter a sensibilidade de produzir isso. Ela é engraçada, ela tem drama, ela tem tudo bem dosado. E dá para você maratonar rapidinho: são poucos episódios, episódios de 20 e poucos minutos. É o tipo de formato que eu gosto. Hoje em dia eu não estou muito curtindo séries que são de uma hora. Eu não tenho esse tempo para perder. [risos de todos] Recomendo Atypical na Netflix.

Cris Bartis: Resolve numa sentada.

Ricardo Terto: Posso só falar mais um?

Cris Bartis: Claro.

Ricardo Terto: Eu sei que esse aqui é em causa própria, mas eu lancei um livro, gente.

Ju e Cris: Aêêêê!!!

Ricardo Terto: O “Marmita Frias”. É um livro muito legal, como eu já disse, ilustrado aqui pelo queridíssimo Oga, que tem apresentação do Marcelino Freire. Quem gostou, quem leu já deu uns retornos legais. [Ju: Muitos likes.] Muitos likes. Curtam. É um tipo de livro que é para você ler indo para o trabalho, ou voltando ou… enfim. A editora é o Lamparina Luminosa.

Ju: Oguinha.

Oga Mendonça: Bom, essa conversa de meme, eu queria indicar um clipe do O Terno, “Não Te Espero Mais”. Apenas vá lá no YouTube, vai estar o link. [Cris Bartis: Curto muito O Terno.] Tem tudo a ver com essa questão digital que a gente estava falando. Também queria indicar um disco, que é um disco de um MC da Bahia, que chama Baco Exu do Blues. Ele lançou um disco muito legal. Putz! Vejam a capa. A capa é muito foda. Toda a parte gráfica é incrível. Mas é muito legal porque acho que ano passado ou retrasado ele lançou uma faixa chamada “Sulicídio”. Essa faixa foi bem polêmica porque eles questionavam muito um eixo que existia no rap, de a galera do Sul fazer sucesso e a galera do Nordeste, fora do eixo, não fazer sucesso. Isso foi superpolêmico e tal. E botou esses dois MCs no mapa; o Baco é um deles. Agora lançou o disco dele. Cara, é muito interessante o disco. É um disco de rap mais moderno, mas as letras são muito legais, são muito provocativas. Eu adorei uma frase que ele escreveu meio conceituando o disco. Não está no disco, mas ele escreve como conceito. Ele fala assim: “Deus só tem força se a gente acreditar nele. E a gente só tem força se acreditarmos em si mesmo. Então nós somos deuses.”. Cara, quando você vê a arte, na arte da capa está escrito “Jesus”, ele corta o J e o S, então fica “Esu”, uma alusão a Exu e tal. É muito interessante. Ouçam. Eu estou assistindo uma série no Netflix, que chama The Outside Man. É muito legal. É uma série documental na Netflix. Ele é negro. Ele vai na África do Sul ver a favela dos brancos lá e vai investigar isso. Ele vai no bairro mais violento, ele passa uma noite no hospital mais violento de Johanesburgo, ele fica no meio de uma guerra de gangues. É muito interessante. Esses são os capítulos da África do Sul. Depois ele entrevista um pastor que ganha muito dinheiro na África do Sul e que é um cara superpolêmico. Depois ele vai para a Rússia, no meio de uma passeata do partido neonazista russo, ele negão. Cara, é muito boa essa série.

(Bloco 16) 1:15’00” – 1:19’59”

Oga Mendonça: Cara, é muito boa essa série. Você fica o tempo inteiro tenso. Nesse capítulo, se você é um pouco sensível a sangue, vá com moderação [risos de todos] porque é bastante explícito. Eu não quero ficar dando spoiler, mas enfim. Assistam. São muito legais as séries de reportagem dele.

Cris Bartis: O nome do programa é…?

Oga Mendonça: Reggie Yates, The Outside Man. Tem outra série, que é a Trapped, que é uma série islandesa incrível. Tem no Netflix. Não vou falar muito sobre ela. E tem um livro que eu estou lendo agora, que é dum cara que se chama Paul Beatty, se chama “O Vendido”, foi lançado pela Todavia. E esse livro é incrível. Também vocês podem correr atrás. Mas eu queria indicar a Todavia. É uma editora que… Putz. Eu estava comprando muito livro digital. É uma editora que dá vontade de você ter todos os livros na mão, não pelas capas serem maravilhosas, mas porque (eu estava conversando com uma amiga que fez a produção gráfica), cara, é uma brochura que você abre e ela fica aberta, tipo livro gringo. [risos de todos] É muito diferente a experiência de você ler um livro muito bem-feito. É isso.

Ju: E você, Cris?

Cris Bartis: Eu vou indicar um filme de terror que fez bastante sucesso ano passado, ou há uns dois anos, não sei. Ele está no Netflix. O nome do filme é Raw. Eu já falei aqui que eu gosto de terror, né? Eu gostei muito desse filme. É uma mulher que dirige esse filme. É um filme de estreia dela. E não dá para acreditar que é um filme de estreia porque ela dirige com uma segurança esse filme… Basicamente é uma história sobre uma jovem que é vegetariana, que vem de uma família de vegetarianos e que vai para uma escola de veterinária, onde os pais dela estudaram e onde a irmã dela já está estudando. A partir de um trote, a vida dela muda. É uma metamorfose, e você vai acompanhando a metamorfose dessa jovem. A menina é muito boa, você acredita na fragilidade dela, você acredita por todos os momentos que ela está passando. A trilha sonora é muito boa. É um filme francês e tem um sotaque maravilhoso, tem uma trilha sonora legal, tem as festas de faculdade, que dá para relembrar bons tempos. [risos de todos] Mas a diretora não te prepara para o que vai acontecer. Quando a metamorfose vai ganhando corpo e você entende o que está acontecendo… Eu soltei alguns risos nervosos, sabe? Ele te dá alguns risos nervosos. Eu acho que é um filme que tem mulheres trabalhando, mostrando um bom trabalho ali das atrizes. Elas parecem muito bem entrosadas com a diretora. O filme tem um punch muito bom. É um filme que em diversos momentos está falando sobre encarar a vida adulta e isso está transvestido ali de uma metamorfose aterrorizante. Recomendo. Achei bem legal. Os mais sensíveis, não assistam: tem muito sangue, muito sangue, muito sangue. Assistam Raw. Assistam. É bem legal. De novo, os mais sensíveis não vão gostar: tem muito sangue.

Ju: Eu vou indicar, já em preparação para o podcast que a gente vai fazer sobre o Conto da Aia, o Handmaid’s Tale. Eu li o livro O Conto da Aia, que muita gente tinha falado no Twitter quando a gente falou “a gente vai falar sobre a série”: “Você tem que ler O Conto porque O Conto é muito bom.”. Eu confesso que na primeira metade eu não estava vendo muita vantagem em ler O Conto, e isso é muito raro.

Oga Mendonça: Eu comprei. Eu fiquei com medo. Eu comprei o digital e ainda não li porque eu fiquei com medo de tomar muito spoiler da série. Eu estou gostando tanto da série. Você acha que anula? Não. Que nem Leftovers não atrapalha você ler o livro.

Ju: Eu acho que a série foi muito bem adaptada porque tem muito mais ação do que o livro, tem muito mais coisa que acontece na série que não acontece no livro. A série tem mais personagens, o livro tem menos personagens. Você está indo para a tela, você está no visual, você está em acontecimentos e menos em reflexões. Normalmente quando você lê o livro e vê qualquer filme, série, enfim, você já imaginou todo um universo na sua cabeça e aí você tem o choque dessa imaginação. Eu fiz o oposto. Eu já estava lá com os personagens prontos na minha cabeça e fui ler o livro. Eu não sou uma pessoa muito visual e essa série é extremamente visual. Então eu acho que o impacto que eu tive com a série eu não consigo ter com o livro. Não me passou pânico, terror. Essa atriz, depois de ler o livro, eu respeito mais ainda porque ela transmite muita coisa. É muito difícil um livro te transmitir menos do que a série. Mas, o constante medo, a atmosfera que a série construiu foi tão forte que para mim o livro não construiu toda essa opressão. A parte visual da série realmente está muito forte. O que o livro vale a pena? E acho que sim vale muito a pena ler, não sei se antes ou depois da série. Ele trabalha mais na reflexão. Isso é uma questão de plataforma mesmo. Livro é melhor para fazer reflexão do que filme, série, enfim, audiovisual.

(Bloco 17) 1:20’00” – 1:24’59”

Ju: Por exemplo, tem um monte de personagens que existem na série que não existem no livro, mas no livro existe a mãe dela e na série não tem.

Oga Mendonça: No livro tem mais o passado, Ju? Que é uma coisa que na série me dói. Como chegamos aqui?

Ju: Tem. É isso que eu ia dizer. O livro fala muito da mãe dela e a mãe dela é uma feminista. A mãe dela se ressente por que a gente não tem noção do caminho que foi trilhado para que a gente tenha os privilégios que a gente tem hoje. Se você não conhece esse caminho, você não conhece também como se defender para que as coisas voltem. Enfim. O livro faz mais reflexões sobre isso, tem mais sobre a mãe dela, que representa feministas, que representam o modo de lutar. Eu comecei a gostar mais do meio para o final do livro, quando ela começa a entrar mais no porquê, no que está acontecendo e tal. Eu fiquei com vontade de reler o livro com uma caneta na mão (que o livro não é meu, o livro é da minha sogra) para ir riscando e colocando reflexões. Ele tem passagens, sei lá, uma frase que dá para você ficar pensando uma semana inteira, um mês inteiro. Mas a série também fez isso por mim. É uma das raras adaptações que eu falo: “Cara, é uma obra sozinha.”. A série é uma obra impressionante. Eu acho que vale a pena ler. Outra coisa, que também foi indicação de vocês, queria agradecer muito todo mundo que indicou, muita gente indicou o podcast da NPR, um podcast novo que se chama Rough Translation. Eu gostei muito do formato (conversei com a Cris) porque eles fazem reflexões profundas em episódios de 30 minutos.

Cris Bartis: Será, Juliana, que nós poderíamos fazer um episódio, sim, caso a gente bata a nossa meta?

Ju: Olha aí. Fica aí a referência. O que eles fazem? Eles pegam discussões que estão quentes nos Estados Unidos e vão para outros países – por isso o “Translation” – e vão ver como elas se comportam em outros países. Por que nos indicaram isso? Porque um dos episódios foi sobre raça no Brasil. Como é a discussão de raça nos Estados Unidos, como a gente faz a nossa discussão de raça aqui? Eu gostei muito do jeito que eles construíram o episódio. Eles têm o jeito de contar a história deles, que é sempre muito bom, quem escuta os podcasts da NPR, são sensacionais. Ele faz as entrevistas, ele alinha, ele conta as histórias e ele não se posiciona. É assim. E não tem um “é bom por causa disso, é ruim por causa disso”, você pode tanto terminar de ouvir achando que “putz… acho que não tem nada a ver, acho que a gente está fazendo tudo errado” como falar: “Nossa, olha como é mais complexo isso no Brasil.”. Você pode terminar fazendo a leitura que você quiser. É bem aberto. E eu gostei muito disso. Como a gente estava falando no programa, em tempos de lacração, em que tudo é opinião, opinião, opinião, eles colocam uma provocação. São 30 minutos para você escutar histórias que vão te fazer pensar – e aí durma com um barulho desses; você quem vai pensar aonde você quer chegar. Gostei muito. Obrigada pelas indicações. Vocês indicaram mais podcasts. Estarei ouvindo – tá, pessoal? – [Cris Bartis: Vou estar ouvindo.] para poder resenhar para vocês. Muito obrigada pelas indicações.

Oga Mendonça: Só queria complementar a sua dica sobre o Handmaid’s Tale. Tem um canal de YouTube que se chama Nerd Writer.

Ju: Ah! Sim! Eu vi.

Oga Mendonça: Você viu?

Ju: Sensacional.

Oga Mendonça: São discursos, né? Eles fizeram um capítulo que eles explicam o shallow focus, o foco doce que tem no Handmaid’s Tale. Você foca o nariz da pessoa e desfoca tudo. A diretora de fotografia usa muito isso, e usa de um jeito muito sábio, porque senão tudo parece vídeo de casamento; o jeito que ela faz não parece. Isso ajuda na narrativa.

Cris Bartis: Olha, o slow, o foco, as cores, as cores das roupas e a trilha sonora é o impacto que a Juliana estava falando: é tudo trabalhado com primazia.

Ju: Isso está no livro. Só que eu não sou uma pessoa visual, então na minha cabeça eu não consigo ler e criar a imagem impactante do jeito que ela fez. Porque normalmente é o oposto, né? [Oga Mendonça: Sua imaginação supera.] A tevê nunca consegue chegar na sua imaginação. Não, cara. O mundo que ela criou é muito mais potente, muito mais impactante do que eu consigo imaginar na minha cabeça. Realmente eu acho que vale a pena ler o livro, tem coisas que não tem na série, mas ler o livro só me fez tirar mais ainda o chapéu para a série.

Oga Mendonça: Viraram duas formas de conteúdo, que são válidas e equânimes.

Cris Bartis: É isso então? Temos um programa?

Ju: Temos.

Cris Bartis: Fica com a sua sensação de mais um Mamilos no ar. Bom feriado.

Ju: Tchau, pessoal.

Oga Mendonça: Tchau, tchau.

Ricardo Terto: Tchau.