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“Westworld” retorna para a segunda temporada disposta a corrigir erros do passado

Segundo ano da mais recente superprodução da HBO começa os trabalhos mais interessada por seus personagens que pelos mistérios em torno deles

por Pedro Strazza

Embora tenha se provado um sucesso de audiência instantâneo para a HBO logo em sua primeira temporada“Westworld” encarou todo tipo de problema criativo neste início de trajetória pela televisão estadunidense. Tendo o mistério em torno de sua trama como principal atrativo, o seriado criado e comandado por Jonathan Nolan e Lisa Joy decidiu criar tanto suspense em torno de sua história e de seus temas no primeiro ano de vida que acabou presa a uma estrutura luxuosa desprovida de qualquer conteúdo, com diversos personagens potencialmente interessantes incapacitados de assumir qualquer protagonismo e uma narrativa rocambolesca tão enrolada em seu suspense e reviravoltas que se viu impossibilitada de existir fora do eixo novelesco do qual buscava escapar. Ao invés de profundidade, o programa mostrou-se raso na lógica “o que vem a seguir?” que decidiu realizar nos dez episódios iniciais, tornados aqui em uma espécie de grande piloto para a produção.

Talvez tenha sido por conta de todos estes entraves que a série tenha decidido por um retorno mais “organizado” da trama no debute de seu segundo ano, que no último domingo (22) fez sua estreia na televisão quase um ano e meio depois do season finale do anterior. Ainda que tenha mantido a dinâmica habitual do seriado intacta, o episódio “Journey Into Night” se desenvolveu de uma maneira mais “convencional” perante a lógica da produção televisiva americana, servindo muito mais como reintrodução da história e estabelecimento de suas dinâmicas que como prosseguimento imediato do gigantesco quebra-cabeça elaborado por seus criadores.

Se por um lado a medida deve ter desapontado os fãs mais apaixonados por não oferecer grandes novidades aos mistérios que tanto tentam solucionar, ela não deixou de ser bastante benéfica à estrutura de “Westworld” enquanto programa, pois foi graças a este movimento que o seriado pode enfim reorganizar a trama confusa que vinha contando até aqui. Como qualquer retorno de qualquer outra produção televisiva, o capítulo inaugural do segundo ano da série designou novas linhas narrativas para os próximos nove capítulos, realocou e introduziu diversos personagens de forma a estabelecer novos pareamentos entre eles e começou a esboçar protagonistas para liderar seu difícil quebra-cabeça.

Esta última parte em especial é fundamental para os caminhos e objetivos de “Westworld”. Como bem atenta James Poniewozik em seu artigo no The New York Times sobre os primeiros cinco episódios desta nova temporada

, um dos principais problemas da série em seu início foi a ausência de personagens para incorporar suas temáticas, algo que Nolan e Joy parecem tentar reparar agora categorizando a história em núcleos claramente distintos em seus objetivos e pontos de vista: enquanto Dolores (Evan Rachel Wood) e Teddy (James Mardsen) lideram a revolução dos anfitriões, Bernard (Jeffrey Wright) busca ajudar a executiva Charlotte (Tessa Thompson) a sair do parque, ao passo que Maeve (Thandie Newton) parte em busca de sua “filha” com o auxílio de Lee (Simon Quarterman) e o Homem de Preto (Ed Harris) ganha um novo jogo para resolver no ambiente agora inóspito.

A dinâmica mais direta do episódio não significa, porém, que Nolan e Joy tenham abandonado suas ambições labirínticas com a produção

Todas estas tramas hão de se desenrolar a princípio no período de onze dias, onde um futuro Bernard desperta desmemoriado para descobrir junto do público as consequências dos atos que irão acompanhar nos próximos capítulos. É um período de tempo relativamente curto, mas que serve para estabelecer ao espectador o espaço no qual o programa trabalha e permitir a ele que se concentre na história ao invés de se perder nas milhões de teorias que circulam entre os fãs. Neste sentido, a série parece ter assimilado uma frontalidade inédita a seu encadeamento de fatos, mesmo que feita dentro dos limites postos por sua narrativa complexa.

A dinâmica mais direta da estrutura não significa, porém, que Nolan e Joy tenham abandonado por completo suas ambições labirínticas com a produção, e o funcionamento do seriado nestas próximas semanas vai depender muito do quão decididos eles estarão de manter este jogo de cartas fechado em si mesmo. Como a anormal recapitulação extensa do programa neste início de segundo ano bem sugere (foram quase quatro minutos pra recordar tudo que aconteceu), a série em dez capítulos se mostrou extremamente inchada em tramas e subtramas que não se mostraram nada além de (mal ensaiadas) cortinas de fumaça, uma gordura trajada de dramaturgia que não conseguiu sair da posição de estofo para distribuir os enigmas da história por todas as suas extensas onze horas. A culpa deste lado mais novelesco não funcionar recai no próprio ato de apostar no mistério como único atrativo da trama, uma noção que sugere falsa austeridade por parte da obra e agora pode ser um pouco mais diluída nos novos capítulos.

Mas ainda que “Journey Into Night” acene para esta tendência em seus esforços de manter a narrativa em passo rápido, este assombro da “enrolação” continua a pairar neste reinício de trabalhos nos caminhos paralelos à guerra entre humanos e robôs. As duas vítimas principais deste começo de temporada sem dúvida são os arcos do Homem de Preto e Maeve, cujas trajetórias nesta nova leva de episódios sugerem um novo cozimento em banho-maria enquanto suas participações efetivas na trama não acontecem pela manutenção de seus arcos anteriores, seja no primeiro que depois do Labirinto se vê atrás agora de uma Porta – sua própria história no mundo do parque, como diz o avatar do falecido Ford (Anthony Hopkins) – ou na última que vai atrás de seu passado para encontrar novas respostas sobre sua identidade.

A vantagem do segundo ano em cima do primeiro é a maior liberdade no campo da metalinguagem

São estas duas trajetórias em particular que também sugerem um sentimento plausível de manutenção da estrutura da série, mas esta sensação de repetição no fundo deve fazer parte dos planos dos dois showrunners com o programa, que tem no uso da narrativa como elemento narrativo um de seus atrativos mais fortes. A vantagem do segundo ano em cima do primeiro, inclusive, é a maior liberdade neste campo de metalinguagem: se antes os personagens tinham seus desenvolvimentos enclausurados perante a auto-consciência maior do seriado, agora eles por enquanto se veem despidos destas amarras e podem – junto do espectador – trafegar pelo tabuleiro da produção sem a preocupação de uma reviravolta a cada passo – estas, pelo menos por enquanto, ficam reservadas às esquinas.

Isto, pelo menos, é o que dá a entender o primeiro episódio deste segundo ano, que no mais se contenta em criar o suspense sobre as intersecções do parque com as outras áreas e a realidade ainda não exploradas pela série, um ato em si ótimo aos meandros do programa. Se “Westworld” há de se fazer como grande quebra-cabeça da televisão “de prestígio”, que ele pelo menos se divirta com os próprios enigmas.

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