SXSW 2017: Para Nick Denton, o quarto poder sucumbiu ao mercado financeiro
Ex-editor da Gawker debateu o processo que destruiu seu império de mídia e o futuro do jornalismo na Era Trump
Nick Denton veio, viu, venceu… e ruiu. Em uma questão de milhões de dólares, perdeu a Gawker e seu poder de influência após um processo movido por Hulk Hoogan (e bancado pelo bilionário Peter Thiel).
Denton descumpriu, repetidas vezes, ordens judiciais para tirar o conteúdo sobre as sex tapes de Hoogan do ar. Uma atitude que lhe custou seu império de mídia.
Como disse Jeff Goodby, fundador da agência Goodby, Silverstein & Partners e moderador da conversa hoje no SXSW 2017: “Um princípio não é um princípio até cruzar com dinheiro”.
Por mais que se discorde da figura polêmica de Nick Denton, não se pode negar que ele manteve seu discurso de liberdade dos blogs até as últimas consequência.
Nick lembra que nada é mais perigoso que um milionário querendo “justiça”. Pior que isso só se for um bilionário (como Peter Thiel).
O ex-blogueiro afirmou que as pessoas ainda não se deram conta de como esse tipo de perseguição afeta nossa liberdade de expressão, e que o jornalismo vai ser muito atacado até que todo mundo perceba que isso foi apenas a ponta da lança.
Ele admite sua parcela de culpa, de que a linha editorial de seu site cruzou uma linha, já que passou a ridiculizar sem ao menos ter um bom argumento pra isso. Mas que seu caso foi reflexo da divisão cultural.
Ocorrido na Flórida, ele enxergou todo o processo como pessoas de bem vs. jornalistas esquisitos de Nova York. Obviamente que perderia nesse contexto.
Era Trump, mídia e publicidade
Perguntando por Jeff Goodby como se sentir por ter sido silenciado bem na gênese da Era Trump, Nick revelou não assumir uma postura agressiva como a mídia atual. Disse se considerar um extremista de centro.
Enquanto a mídia depender da generosidade de bilionários, vai existir uma vulnerabilidade
Trump acusou a mídia de ser inimiga do povo, de atuar como um partido de oposição. Segundo Denton, a sanha dos veículos ditos liberais por vazamentos e informações que atinjam a atual presidência só revela uma coisa: que, por mais que Trump dê medo, a mídia não pode negar que está fazendo exatamente isso.
Para Denton, agora, pelo menos, está tudo muito claro. O problema é quando tivermos um Trump mais sofisticado. Alguém que vai se enrolar numa bandeira de arco-íris e enganar a todos com um discurso demagógico.
Ele entende que podia ser acusado de sensacionalismo, mas o cenário hoje muito além, com os chamados fatos alternativos. Nascido na Inglaterra, ele afirmou que os britânicos sabem lidar melhor com isso. Um Breitbart não causa comoção lá, pois os tablóides já fazem parte da vida há muito tempo.
Denton tem buscado uma resposta budista ao Breitbart. “A tendência é querer socar o nazista, mas eles é que tem a arma, eles celebram esse tipo de reação.”
Para ele, vivemos tempos perigosos, pois a distribuição de poder incrivelmente desequilibrada. Peter Thiel, seu algoz, vale sozinho mais do que o New York Times.
O tal quarto poder está sucumbindo para o mercado financeiro. Denton citou a compra do Washignton Post por Jeff Bezos, dono da Amazon. Parece uma boa intenção para salver o jornalismo, mas enquanto a mídia depender da generosidade de bilionários e de empresas, vai existir uma vulnerabilidade ardilosa.
Nick Denton, já se desculpando com Jeff Goodby, um mad men, disse que a publicidade é outra vulnerabilidade. Os artigos mais perigosos são sobre marcas. Um review honesto de um produto, pode acabar com as suas chances de sobrevivência através de venda de anúncios.
Algoritmos
Fora da Gawker, Denton tem preferido leituras mais aprofundadas, em vez de perder tempo nas redes sociais.
O Facebook me faz odiar meus amigos, o Twitter me faz o odiar o mundo”
Mas ele não culpa as ferramentas. Para Denton, os algoritmos refletem apenas as nossas próprios tendências, entregam aquilo que queremos consumir, mesmo que de forma inconsciente.
Nick que o Google Hangout é hoje a sua melhor experiência de mídia. Conversas privadas com grupos de amigos.
Dez minutos de conversa com um transgênero faz muita gente mudar de ideia sobre os direitos dos transgêneros. Bem mais efetivo que atirar fatos.”
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