Como as agências podem reconquistar a relevância criativa perante o cliente?
André Kassu, CCO da CP+B Brasil, debateu isso e muito mais no Código Aberto, novo podcast do B9
Na semana passada, apresentamos o novo podcast do B9, Código Aberto. São conversas francas com os profissionais mais influentes do mercado, quais as suas grandes ideias e o que pensam sobre o futuro da mídia, da tecnologia e da comunicação.
O primeiro episódio foi com André Kassu, sobre temas polêmicos do mercado de publicidade. O CCO da CP+B Brasil não mediu palavras para explicar por que as agências estão perdendo relevância criativa frente aos clientes e talentos para outros setores ou pro exterior.
Resumimos aqui alguns dos pontos mais importantes da conversa, mas não deixe de ouvir o papo na íntegra para entender como pensa um dos principais executivos do mercado.
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Retenção de talentos
Quando conversamos sobre o motivo de tantas pessoas estarem abandonando a publicidade ou saindo do Brasil para trabalhar em agências no exterior, Kassu não cedeu a respostas fáceis.
2015 foi o ano que mais saiu criativo do Brasil e a gente tem que entender porque que eles estão saindo. Eu acho muito cômodo falar que é a crise que tá expulsando. Mas não, talvez é o jeito de trabalhar, é outra cultura, o cara quer estar em contato com conteúdo, ele quer estar discutindo coisas com outras pessoas.
Conversamos também sobre os conflitos que a chegada dos Millenials nas agências tem provocado.
No Brasil é muito complicado, porque a gente veio de uma cultura de escravos. A gente tem uma cultura de Senhor de Engenho muito presente ainda. É top down, eu mando, vocês obedecem.
Começa chegar uma geração que não tá muito a fim disso, sabe? E a gente vai perder esses caras se a gente não souber dialogar com eles da maneira certa. Eu não dizendo nem que eles estão certos, acho que tem um ajuste ainda.
Mas já é muito legal a gente viver uma época em que uma geração nova tá dizendo: “não to a fim disso, eu vou embora”. O cara gritou comigo eu vou embora. Na minha época era assim, você não pode nunca sair de uma agência senão ia se queimar com o mercado inteiro. Você tá perdido se brigar com o diretor de criação, o mercado vai te queimar e você nunca mais vai entrar.
E sobre o culto ao gênio irascível, que existe em muitas outras áreas, mas parece ter se tornado folclórico na publicidade
Ser escroto não faz de você o Steve Jobs, faz de você um escroto. Escrotidão sem genialidade não é nada, é só escrotidão. Mas o Bernardinho grita com os atletas e é isso que traz a medalha. Porra, será que é isso, será que não é o treino?”
Antes de fazer coaching eu acho que as pessoas deviam fazer terapia. Elas primeiro precisam se entender.
O Roberto Carlos é um dos caras mais gentis que eu já vi com a equipe. Eu nunca vi nada parecido. Ele cumprimenta todos os músicos, os músicos adoram tocar com ele, ele escuta, agradece. E vi outros que pareciam super simpáticos no palco, mas que atrás não olhavam na cara do músico… Acho desrespeitoso.
Um dia comentaram comigo que um cara de uma agência X entra no elevador e não fala com as pessoas. Como assim? Então você entra no elevador e não dá bom dia pro cara? Se eu ensino para as minhas filhas que ela tem que dar bom dia pro porteiro quando sai do prédio. É sobre educação, gentileza. Pra mim o ponto básico é respeito. E acho que falta de respeito essa geração nova não vai aturar mais.
Eu ouvi uma frase do cara do Netlflix justamente sobre isso. “O babaca talentoso tem um custo operacional”. E ele é alto. Ele pode render prêmio, mas praquilo que tá em volta, ele tem um custo. E esse é o custo que hoje, como gestor, eu não quero pagar.
A agência perdendo relevância criativa
Kassu tem uma visão povocativa sobre o que levou as agências a perderem relevância criativa, em um cenário onde o planejamento ganha força justamente por se colocar junto ao cliente discutindo o negócio dele.
A gente tem uma geração muito estrela. – Quero ser a estrelona da criação. E acho que pros novos clientes isso não faz sentido.
O encontro perfeito pros dois lados é quando eu consigo fazer um trabalho criativo, relevante, que resolva uma questão que ele precisa, uma necessidade relevante dele. Então as duas partes ficam felizes. Em algum momento isso começou a desbalancear. A gente quer aprovar uma ideia que muitas vezes não tem a ver com o briefing e o cara acha que a gente é moleque por causa disso.
Qual é o princípio básico de uma agência de propaganda? Mexer no ponteiro do cliente.”
O maior elogio que eu já vi na história da propaganda foi quando o cara da Sadia disse pro Neil Ferreira: Por causa do seu comercial eu abri três fábricas.
Esse é o princípio da propaganda, se a gente perder esse princípio e achar que a história é sobre nós vamos entender porque o cliente não nos acha relevante.
Sobre o funcionamento de uma agência
Crítico da glamourização do excesso de trabalho, Kassu mostrou uma visão pragmática de como uma agência pode funcionar para que virar noite seja uma exceção e não a regra
Outro dia o Arnaldo Branco cravou a expressão que eu acho que define perfeitamente: Super Trunfo de Drama. Módulo drama: quem se fudeu mais, eu ou você? Eu não gosto do orgulho de estar trabalhando de madrugada, nos finais de semana, como se só tivesse uma forma de fazer. O orgulho disso me incomoda profundamente.
Ralar a gente vai ter que ralar. Trabalhar muito. Mas os filhos ajudam a pressionar você a focar mais.
Especificamente na criação, as pessoas são muito desfocadas. A gente chega tarde na agência e sai tarde. Aí vira um ciclo que você não sabe o que começou primeiro.”
Eu falo isso pra equipe, não gosto do faz mais, pelo faz mais. Eu acho que o dever do Diretor de criação é dar a direção. É pra isso que ele é pago, de fato. O meu dever como diretor de criação, é dar os caminhos para a equipe. E acompanhar a equipe para não ficar atirando pra qualquer lado como se fosse um louco.
A única coisa que eu aprendi fazendo mais é a fazer mais. É sobre desperdício de energia e foco.
Eu acho que muitas vezes a criação erra especificamente sobre isso, tá fora do briefing. o único jeito de você zerar uma redação, seja ela qual for é fugir do tema. O cara fala, a redação é sobre a Síria e você escreve sobre a Grécia. Desculpa, fugiu do tema, zero. Fugir do briefing também é isso. Então perde-se muito tempo fugindo do briefing, aquela crença de novo de que o cliente tá errado. Eu acho que isso ajuda muito a aumentar a bola de neve.
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