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Serviço de carona BlaBlaCar chega ao Brasil

Compartilhamento das viagens será focado em trajetos intermunicipais

por Jacqueline Lafloufa

Quem já foi universitário sabe que caronas podem ser uma enorme mão na roda, com perdão do trocadinho bobo. Afinal, com o dinheiro tão contadinho, pegar uma carona e fazer um trajeto mais barato ou dar uma carona e rachar os custos da viagem são convenientes tanto pra caroneiro quanto para caronista. Eu mesma peguei e dei muita carona durante a faculdade, uma experiência que deixou claro pra mim que conveniência, mobilidade e economia eram possíveis em um mesmo momento, e ainda traziam de brinde ótimos amigos e conversas animadas.

Mas aquela era uma época em que a gente marcava carona pelo paleolítico email, que se mandava SMS para confirmar vaga no carro e até (pasmem!) se ligava para o motorista para reservar a vaga. Hoje, a tecnologia chega pra ajudar a fazer o processo de pegar carona ser ainda mais fácil. E, para felicidade de pais e mães desesperados (“como assim você vai pegar carona com alguém que você não conhece?!?!?”), torna também esse acordo de compartilhamento de carro bem mais seguro.

Depois de iniciativas como o Unicaronas, que há algum tempo foi comprado pela Tripdafalamos disso aqui no B9 no ano passado – quem chega agora pra acirrar a concorrência dos serviços de carona é o BlaBlaCar, serviço de carona famoso na Europa. Você provavelmente vai reparar que eles não são muito fãs do termo carona, preferindo chamar de ‘compartilhamento de viagem’, devido a uma conotação negativa ou a associação a um trajeto feito de forma gratuita. Mas, ó, cá entre nós? É carona mesmo.

Grife Europeia

BlaBlaCar - mapa

Quem já fez mochilão no Velho Continente provavelmente já ouviu falar ou experimentou o BlaBlaCar, conhecido por fornecer trajetos baratos entre cidades da Europa e, de brinde, ainda ajudar o viajante a conversar um pouco com alguém local, transformando a carona em uma experiência de contato com a cultura. No início do ano, quando fiz uma matéria para a Galileu sobre economia do compartilhamento, muitos dos personagens que conversaram comigo falaram sobre a experiência com o BlaBlaCar dizendo que a grande vantagem era a facilidade de arranjar carona para diversos trajetos e ainda poder contar com a hospitalidade de alguns motoristas, que costumavam ser mais gentis quando sacavam que o caronista era estrangeiro.

Fama à parte, o funcionamento do sistema é bem básico, como qualquer outro serviço do tipo, focando em conectar pessoas que fazem um mesmo trajeto, permitindo avaliar quem pega e quem dá a carona e oferecendo através do sistema uma camada de “segurança”. Isso porque o BlaBlaCar se responsabiliza em “garantir” que aquela pessoa é real, permitindo o acesso apenas se houver a possibilidade de se conectar através de uma conta do Facebook.

Forçar a conexão através do Facebook pode ser um pouco limitante, já que quem não tem perfil na rede ficaria de fora do serviço. Mas ao mesmo tempo é também uma maneira de ‘terceirizar’ uma das garantias de que aquele usuário é real, já que o Facebook anda se esmerando em pedir documentos pra galera pra garantir que os perfis da rede são verdadeiros.

Regulamenção: Uber e BlaBlaCar

Chegando no Brasil oficialmente a partir desse mês, o BlaBlaCar aterrisa no país em um momento delicado, quando Uber e taxistas estão no auge das sua batalha – recentemente, um motorista de Uber chegou a ser espancado por taxistas em Porto Alegre, em um episódio repudioso. E o complicado é que carona também é algo delicado em termos de legislação. Na longíngua época de caronista universitária, lembro de existir um certo receio das pessoas que pegavam carona de serem paradas pela polícia rodoviária, que poderia considerar aquela ~modalidade de transporte~ ilegal. Mas o BlaBlaCar não parece preocupado com isso.

Em entrevista ao B9, Ricardo Leite, diretor do BlaBlaCar no Brasil, contou que não acredita que isso vá ser um problema, já que o modelo do sistema de carona não tem a intenção de gerar lucro para o motorista. O foco é ajudar as pessoas a compartilharem vagas ociosas nos seus veículos, intermediando o contato das pessoas que querem dar ou pegar caronas através de plataformas seguras. “Estamos prestando muita atenção nisso para que nenhum empecilho regulatório ou legal atrapalhe o crescimento da nossa comunidade”, defendeu ele.

Por enquanto o foco do BlaBlaCar no Brasil é realizar caronas intermunicipais, o que tira da jogada trajetos curtos dentro de uma mesma cidade. Isso acontece porque existe um custo mínimo onde a “corrida” pode ser viabilizada dentro do modelo de funcionamento do serviço, que daria em torno de 28 km percorridos. Ou seja, se você é de uma cidade próxima de SP e quer ir até a capital paulista, talvez ainda não dê pra usar o BlaBlaCar.

Em todo caso, restrições à parte, ainda pode ser uma alternativa para quem faz trajetos mais distantes com frequência, como o trecho Rio-SP, que numa carona costuma sair por menos que uma passagem de ônibus. Em grandes metrópoles, o app também se torna uma alternativa para quem faz trajetos intermunicipais, como acontece com frequência na grande SP e grande Rio – isso, claro, se o trajeto percorrido atingir o mínimo necessário pra poder ser colocado no sistema do BlaBlaCar.

O último dos moicanos

É interessante notar que serviços como o compartilhamento de caronas podem ser os últimos serviços da economia de compartilhamento a sobreviverem. Recentemente a Fast Company publicou um artigo em que destaca que grande parte dos serviços de sharing economy vieram à falência por serem muito trabalhosos de utilizar, ou por terem menos confiabilidade ou rapidez do que outros serviços tradicionais já estabelecidos no mercado. A situação era ainda pior com produtos de baixo valor, como o clássico exemplo da furadeira: você tem certeza que prefere procurar alguém que tenha uma furadeira para alugar, ir atrás da pessoa, pagar, buscar a furadeira, usar e levar ela de volta para o proprietário, ou dar um pulo em uma loja de construção e investir R$ 50 merréis para ter acesso a uma furadeira?

“Tudo [a teoria da sharing economy] fazia sentido, mas as pessoas não estavam nem aí. Elas iam lá e compravam a furadeira”, explicou Adam Berk, fundador do Neighborrow, em entrevista à Fast Company.

As empresas de “sharing economy” que mais deram certo foram as que conseguiram se tornar eficientes e transacionais. É o caso do Airbnb, que hoje tem um modelo tão fácil de reservar um local quanto um hotel. O Lyft (concorrente do Uber) também começou com a ideia de pegue carona com o seu vizinho, mas agora está competindo preço com o Uber. O Parking Panda, que no começo dizia que era para compartilhamento de vagas entre vizinhos, deu uma mexida no discurso, já que grande parte das suas vagas disponíveis são de restaurantes, hotéis, edifícios comerciais e aeroportos. O Rent the Runway, um serviço de aluguel de vestidos, está cheio de modelitos, mas não exatamente de peças que estão disponíveis no seu vizinho.

Até chamar a Netflix de “sharing economy” soa um pouco absurdo hoje em dia – é muito mais sobre uma “economia do acesso” (acessar um punhado de filmes, séries, produções) do que de “compartilhamento”.

Mas curiosamente no caso das caronas, isso parece se manter verdadeiro. Durante o trajeto inteiro, o motorista e o carona estão no mesmo local. Eles estão efetivamente compartilhando aquele trajeto, e dividindo os custos da viagem (que são levemente regulados pelo BlaBlaCar). Talvez por isso que Ricardo veja esse processo da economia do compartilhamento como algo irreversível: dentro do cenário da carona, todos os princípios e propósitos da economia do compartilhamento se mantém verdadeiros.

Money que é good

Claro que um serviço como o BlaBlaCar não se mantém em funcionamento sem ganhos (já falei que não existe almoço grátis, lembra?)

. E é exatamente por isso que existe a “corrida” mínima da carona, como citei alguns parágrafos atrás. A princípio, o BlaBlaCar no Brasil não terá custo algum, seja para motorista ou para passageiros. O foco da empresa no país é fomentar a comunidade e estabelecer um funcionamento de trajetos mais requisitados, uma boa curadoria e avaliação dos seus membros e, claro, garantir uma boa experiência para todo mundo que utilizar o serviço.

Assim que a comunidade se estabelece, cerca de 1 ou 2 anos depois do lançamento, aí sim o BlaBlaCar começa a cobrar pelo uso do sistema. Quem reserva a carona passa a pagar uma ‘taxa de reserva’, que gira em torno de 10 a 15% do valor da carona que ele vai pegar.

Por enquanto, no Brasil o trajeto e a reserva de caronas ainda devem se manter gratuitos por alguns meses. Além de economizar em tempos de crise, pode ser uma ótima ideia para expandir a sua rede de amigos e conhecer gente diferente.

Meu conselho? Sempre que der, pegue uma carona ou ofereça algumas das vagas disponíveis no seu carro. Transforma a sua viagem e ainda ajuda a melhorar o trânsito nas cidades.

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