Não existe estratégia perfeita. Ela é no máximo uma estimativa de como as coisas devem acontecer, baseada muitas vezes em histórico, cenário, comportamento e contexto. A estratégia perfeita, na minha opinião, não é aquela que não muda mas sim a que muda e se adapta às mudanças.
Explico: a sua estratégia pode ser perfeita hoje mas uma mudança como a que o governo Collor fez ao reter o dinheiro de todos os brasileiros faz com que a sua estratégia não funcione mais. Se ela conseguir se adaptar a esse novo cenário, contexto e comportamentos que derivam dessa mudança, é um mérito quase tão importante quanto ter pensado e desenvolvido aquela estratégia.
Nos anos 1960, a Honda queria voltar a vender nos EUA e, estudando o cenário e comportamento, identificou que poderia entrar no mercado das motos grandes como Harley-Davidson e da britânica Triumph.
Desenvolveram um produto e colocaram no mercado. O projeto tinha problemas, o custo da manutenção era alto (as motos eram enviadas para o Japão para serem consertadas) e a operação americana estava tomando um prejuízo gigante. Eles tinham também um outro produto que era uma moto menor – as famosas Honda 50 ou Super Cub – que eles imaginavam que, como no Japão, seriam mais usadas para entregas por serem mais estreitas e menores que as que os americanos gostavam.
Uma mudança de estratégia é capaz de recuperar o negócio
A estratégia inicial estava afundando a empresa. Eles não sabiam o que fazer. Os funcionários podiam usar essas motos menores quando quisessem e, um dia, um deles revoltado com a situação toda, pegou uma e foi para as montanhas no Oeste de Los Angeles. Ficou andando de moto por meio de trilhas para descarregar um pouco aquela pressão toda e se divertiu um monte.
A moto respondia bem naquele terreno, fazia curvas rápidas e tal. Na semana seguinte ele chamou uns amigos do trabalho para ir com ele. Em algum tempo, isso começou a se tornar algo que chamava a atenção e as pessoas começaram a perguntar que motos eram essas? O que eram aquelas dirt bikes e onde poderiam compra-las?
A mudança na estratégia veio daí e recuperou o negócio. Claro que tiveram negociações com a Sears, reposicionamento, campanhas e etc, mas o ponto é: a estratégia inicial de vender motos grandes mudou para vender motos, principalmente para um público “não motoqueiro”. É uma coisa que parece simples mas não é. E foi feita.
Tudo foi planejado, funcionou perfeitamente e tivemos esses resultados incríveis. E isso aconteceu em um mundo paralelo.
No livro “Rework”, os caras da 37Signals (ou Basecamp) falam que “Planning is Guessing”. Embora o racional deles tenha um Q de verdade, acho que não dá para ser levado ao pé da letra. O trabalho do planejamento é muito importante e reduzi-lo dessa maneira não é justo.
Só que quando chegamos na publicidade, especificamente nos video cases, notamos que não existe nada que dê errado. Tudo rodou perfeito como se pudéssemos prever e nos programar tanto assim. Se a sua ação inovadora que deu resultado para o cliente e está sendo inscrita em prêmios fluiu tão perfeitamente assim, por que isso não acontece com todas as outras?
Claro, em um vídeocase há a limitação de tempo e o que não é essencial para ação geralmente cai e o papel do videocase é reforçar as coisas boas. Mas quando olhamos os vídeos de projetos do Kickstarter (e até o decorrer dos projetos) notamos que eles focam em falar que estudaram as possibilidades, erraram um monte e chegaram no que achavam ser a melhor opção. Até começar o projeto e perceber que ainda haviam muitas coisas para resolver antes do produto ficar pronto. Olha o nível de trabalho (pré-produção e produção) de um vídeo Demo de um app.
Em 2010, o Gustavo Mini tuítou algo sensacional e nem sei como me lembrei disso mas aqui vai:
Eu queria morar dentro de um videocase ou de um Power Point. Tudo funciona dentro deles!
— conector (@conector) November 24, 2010
E é isso que me incomoda. Tudo foi planejado, funcionou perfeitamente e tivemos esses resultados incríveis. E isso aconteceu em um mundo paralelo. No mundo real, tiveram que fazer ajustes no produto, na campanha, no roteiro original para se adequar às necessidades do cliente sem tirar o brilho criativo.
Agora lembre dos vídeos do OK GO. Independente do planejamento, pense na quantidade de vezes que eles devem ter ensaiado antes de começar a gravar? É o mesmo que achar que todos os filmes podem ser gravados em um take só. Isso é tão raro que quando fazem algo de maneira magistral como fizeram em “True Detective” em um plano sequencia de 6 minutos, de “Festim Diabólico” do Hitchcock e até as várias cenas de “Filhos da Esperança”.
Mesmo com muito planejamento sempre tem um erro. As vezes é grande outras não. Pode ser desde o fato de o microfone que aparece toda hora no filme “Os Outros”, o cameraman no reflexo do comercial da Sony, um carro passando no fundo de uma cena do “O Senhor dos Anéis” e até o produto não funcionar direito no dia e o seu uso ser simulado. São coisas que acontecem e que não foram previstas, e que apenas um olho mais atento notaria. Mas apenas no mundo real. No mundo mágico dos vídeos cases tudo é perfeito.
Acho que os festivais tinham que criar uma categoria Making Of
só para mostrar os sufocos de produção e tal. Mas pensando bem, talvez eles caíssem em outro mundo paralelo: o mundo amaldiçoado dos Making Ofs em que todo mundo quer mostrar que superou situações terríveis para montar determinado projeto.
Estamos perdidos.
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