O que a internet está fazendo com o nosso cérebro?
Se você já se fez esta pergunta, não está sozinho na busca por respostas
Outro dia, o Braincast falou sobre a década de 1990, como as coisas eram no final do século 20. Parece loucura pensar que já estamos quase na metade da segunda década do século 21 e que já existe uma geração inteira por aí que não consegue imaginar um mundo sem internet e todas as tecnologias e mudanças sociais que ocorreram desde então. Só que ao mesmo tempo em que a web proporcionou avanços incríveis, ela também fez com que o ser humano regredisse em incontáveis aspectos, um deles ligado diretamente à criatividade, aprendizado e a maneira como raciocinamos.
Afinal, o que a internet está fazendo com o nosso cérebro?
Se você nunca se perguntou isso, talvez agora seja um bom momento para pensar a respeito. Pensar. Será que a gente se lembra como fazer isso de verdade, de maneira consciente e não no piloto automático? Às vezes tenho a impressão de que nós, seres humanos, estamos nos esquecendo como desempenhar funções básicas, não porque evoluímos e aprendemos algo novo no lugar, mas porque simplesmente desaprendemos deixando que uma máquina faça tudo por nós. E por mais que a gente pense que o acesso à informação está cada vez mais democrático, ao mesmo tempo a maneira de encontrar esta informação não é nada democrático, já que apenas alguns poucos “escolhidos” são capazes de desenvolver algoritmos para tal.
Ou seja: você joga uma busca no Google, que devolve os resultados para você, mastigados segundo o que aquela combinação de algoritmos definiu. Geralmente, a gente acaba se dando por satisfeito e pronto, fica por isso mesmo. Daí, me ocorreu o seguinte:
Será que o Google está matando a nossa curiosidade, criando uma falsa sensação de saciedade?
Já tem algum tempo que eu tenho pensado a respeito e tenho certeza de que nós – eu, você e outras pessoas – não estamos sozinhos na busca por respostas a estes questionamentos, especialmente se você faz parte daquela parcela da população que se lembra de como era o mundo analógico, quando as pesquisas para a escola eram feitas em bibliotecas (Barsa e Guia do Estudante, quem nunca?) e você precisava esperar meses para ouvir uma música nova ou assistir a um filme.
Não, eu não estou sendo saudosista, nem reacionária, adoro poder ouvir a música nova do David Bowie no exato momento em que ela é lançada. De não precisar deixar o videocassete gravando um programa na MTV, só para poder assistir ao videoclipe deste ou daquele artista. Eu só acho que talvez seja exatamente por conta desta facilidade que as coisas estão se tornando cada vez mais superficiais e efêmeras, por assim dizer.
Daí eu te pergunto: que história tem aquele filme ou aquela música que você baixou da internet?
Tudo se tornou consumível, reciclável. Você consome uma coisa e, quando se cansa dela – o que ocorre com rapidez cada vez maior – vamos para a próxima. Não existe mais aquela coisa de se criar uma expectativa e, quando ela finalmente chega, você vai e curte durante um bom tempo, até se cansar. E, quando se cansa, não joga fora ou recicla. Você guarda. Eu tenho um monte de livros e discos aos quais sou apegada porque tive de esperar por eles. Cada um tem sua própria história, que faz parte da minha história, representa um momento da minha vida ou uma lembrança.
Mas, voltando à rapidez, será que com um volume tão grande de informação, a uma velocidade tão absurda, a gente consegue reter alguma coisa? O Epipheo Studios (que tem o Google entre seus clientes), fez uma entrevista com o escritor Nicholas Carr sobre esse assunto e criou uma animação muito legal e altamente esclarecedora, What the Internet is Doing to Our Brains.
Se você não ligou o nome à pessoa, Nicholas Carr é o autor de A Grande Mudança e, mais recentemente, Geração Superficial.
Carr explica que nós nos tornamos uma espécie de dependentes digitais, que precisam ficar checando emails, smartphones e afins o tempo inteiro – curiosamente, uma espécie de evolução de instintos pré-históricos. Isso pode ser prejudicial por várias razões, mas uma delas está ligada diretamente à nossa capacidade de aprendizado, denominada consolidação da memória. É o processo que leva a informação da memória recente para a memória de longo prazo e permite que a gente crie conexões entre elas.
Na prática, sabe quando você começa a fazer alguma coisa, mas daí o telefone toca ou você recebe uma mensagem, e no segundo seguinte esquece completamente o que ia fazer? É mais ou menos isso: você lê alguma coisa, mas na hora de o cérebro transferir os dados, uma interrupção qualquer acaba causando um pau na HD.
E Deus falou: só a atenção salva…
Ok, não foi Deus quem disse isso. Foi Nicholas Carr, só que com outras palavras. Mas acho que você entendeu a ideia. Quer “salvar” uma informação na sua memória de longo prazo? Preste atenção no que está fazendo e evite distrações. Acredite, isso é um fator determinante entre criar alguma coisa ou apenas reproduzir algo que você viu.
Parece complicada essa coisa de se desligar mas, de fato, eu acredito que seja possível haver um equilíbrio entre digital e analógico, aproveitando-se o melhor dos dois universos. É muito prático ter uma biblioteca inteira em um tablet, mas não existe nada como o cheiro de livro novo (ou velho, em alguns casos). Sem contar que o tablet sempre tem muito mais do que livros, mas um monte de outras distrações que podem se tornar muito mais atraentes do que a leitura em si. Já o livro… é você e ele.
A era digital é ótima, mas imaginação e curiosidade para continuarmos em frente é essencial. E isso só cultivamos com um cérebro bem nutrido de realidade, informações, referências, histórias, experiências e até algumas distrações, desde que sua memória não seja prejudicada.
Se esse assunto já acabou? De forma alguma. Essa conversa só está começando.
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