Behind The Brains: Where The Wild Things Are
Trilha sonora recomendada para a leitura desse post, é tambem a música do trailer de “Where The Wild Things Are”
O diretor Spike Jonze, depois de dirigir uma tonelada de videoclipes famosos e filmes como “Quero Ser John Malkovich” e “Adaptação”, passou a ser considerado um visionário. Não por menos, suas escolhas nonsense e criativas em parceria com o roteirista Charlie Kaufman chamaram a atenção quase que instantânea de Hollywood, que o indicou ao Oscar de Melhor Diretor em 2000 (mas quem levou foi Sam Mendes, por “Beleza Americana”).
O rótulo preferido da mídia para caras como ele é “excêntrico”. Apesar disso, Jonze dirigiu um monte de comerciais, como o “Hello Tomorrow” da Adidas e “Pardon Our Dust” da Gap, além de atuar em filmes de amigos e ainda editorar revistas da cena BMX e skate. Jonze também é co-criador da série politicamente incorreta “Jackass” da MTV. E é justamente desse cidadão, nascido em Rockville, Maryland, EUA, um dos filmes mais hypados e aguardados do ano. Eu sei, isso parece frase de trailer, mas se considerarmos o buzz gerado apenas com o pouco de material lançado até agora, não é exagero.
Ficou na mão de Spike Jonze, e do inexperiente roteirista Dave Eggers, transformar uma história de 338 palavras em um roteiro de 111 páginas. Escrito e ilustrado por Maurice Sendak em 1963, “Where The Wild Things Are” (Onde Vivem os Monstros) é um dos mais cultuados livros infantis da curta história do mundo, pequeno em tamanho, mas enorme em idéias.
A obra segue as aventuras de Max, um garoto malcriado que foi mandado para a cama sem jantar. Depois de ser chamado de “wild thing” pela mãe, ele vai pro quarto e começa a imaginar um mundo distante em que chega de barco, a terra dos Wild Things. As estranhas criaturas selvagens desse lugar acabam transformando Max em uma espécie de Rei. “Where The Wild Things Are”, ao mostrar um garoto solitário, com pai ausente, irmã e mãe cada vez mais ocupada com o trabalho, estabelece um belo retrato psicológico da raiva.
Segundo Sendak, o conceito original do livro incluia cavalos ao invés de monstros. Porém, ele resolveu trocar de personagens quando descobriu que não sabia desenhar cavalos. Em seus desenhos feitos em aquarela, Sendak representa criaturas exóticas, com ar demoníaco, mas que ao mesmo tempo transmitem algum tipo de carisma e charme.
No recente vídeo making-of divulgado pelo diretor Spike Jonze (assista abaixo), o escritor revela que o livro foi um grande risco comercial, sumiu das prateleiras e sofreu pesadas críticas dos entendidos literários. Sendak conta que apenas dois anos depois do lançamento é que as pessoas começaram a perceber o valor de “Where The Wild Things Are” como uma obra infantil.
Com 109 contos publicados, as inspirações de Maurice Sendak foram sua própria vida. Os protagonistas de suas histórias são uma espécie de alter-ego, como o Max de “Where the Wild Things Are”, e os monstros representam seus medos e membros da própria família. A infância de Sendak foi complicada. Cresceu no Brooklyn, depois que seus pais se refugiaram do anti-semetismo crescente na Polônia da década de 1930, e os primeiros anos nos EUA foram marcados por complicadas doenças.
Sendak não podia sair muito na rua para brincar com outros garotos, então seu passatempo era ler e assistir filmes. Como ele mesmo revela no documentário “There’s a Mystery There: Sendak on Sendak”, sua primeira experiência com storytelling foi logo na infância. Baseado nos filmes que via no cinema, o menino Sendak contava diversas histórias para as outras crianças, alterando e criando partes, e se colocando como um personagem.
“Where The Wild Things Are” também é auto-biográfico, e vai na contramão do que a literatura infantil oferecia na época. Para Sendak, a grande parte dos livros voltados para crianças são moralistas, sentimentais e com personagens que se comportam bem, uma falsa sensação de conforto. Não existem ações impulsivas ou emoções repentinas. A essência de WWTA reside na autenticidade dos sentimentos e medos infantis, em colocar uma criança em um mundo mágico e assustador, mas ao mesmo tempo não completamente protegida.
E como um diretor de cinema pode transformar isso em um filme live-action? Só com a colaboração irrestrita do autor, é claro. Na adaptação para a tela grande, o trabalho conjunto de Maurice Sendak e Spike Jonze é mais próximo do que poderíamos imaginar. A responsabilidade de Jonze é imensa, mas o próprio Sendak declarou que mais do que adaptar, o roteiro desenvolvido por Jonze e Eggers ampliou e enriqueceu a história original. Quem assistiu os 10 minutos do longa exibidos na Comic-Con 2009, garante que é uma mistura fantástica das emoções e detalhes psicológicos imaginados por Sendak, com o inventivo senso visual criado por Jonze.
Tudo parece acertado agora, mas o filme de “Where the Wild Things Are” passou por uma série de problemas até sua data de estréia finalmente ser definida: 16 de outubro de 2009 (23/10, aqui no Brasil). Quem antes tinha os direitos sobre a adaptação era a Universal, mas desentendimentos entre o estúdio e o diretor levaram o filme para a Warner Bros.
As filmagens ocorreram em um distante abril de 2006 na Austrália, e o material ficou envolvido em discussões criativas até pouco tempo atrás, entrando em pós-produção somente em meados de 2008. Isso porque, em fevereiro do ano passado, rumores dão conta de que a Warner considerava refilmar todas as cenas. O motivo: em sessões teste do filme, crianças estavam saindo chorando e assustadas da sala de cinema.
Para a Warner, o clima sombrio e melancólico adotado por Spike Jonze não combinava em nada com o que eles tinham imaginado ser uma obra infantil comercial. O diretor concordou em repensar algumas cenas, mas sempre deixando claro que não se tratava de um filme-fantasia para crianças de 4 anos de idade, e sim algo de verdade, para crianças de verdade. O roteiro permaneceu intacto, desde que foi finalizado no final de 2005, e o estúdio cedeu a grande parte das escolhas criativas de Jonze.
Obviamente, ajuda o fato de que a Warner tem em sua estratégia recente diversos motivos para se assegurar. Combinar diretores novatos e talentosos com material mainstrean tem sido uma jogada de mestre da companhia. Foi assim com Christopher Nolan e “Batman Begins” / “The Dark Knight”, Alfonso Cuarón e “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”, Steven Soderbergh e “Onze Homens e Um Segredo”. É claro que fica de fora dessa conta o fiasco Wachowski Brothers com “Speed Racer”.
Cenas de “The Quiet Room” e “Ratcatcher”, filmes que inspiraram Spike Jonze para o tom de “Where The Wild Things Are”
No blog We Love You So, Spike Jonze conta que assistiu uma infinidade de filmes para decidir o tom que daria para “Where The Wild Things Are”. Ele cita dois, em particular, que influenciaram fortemente suas escolhas: “The Quiet Room” e “Ratcatcher”. Ambos mostram o mundo pelos olhos de crianças, que narram suas experiências e medos.
O diretor conta também da busca pelas emoções naturais e sinceras durante as filmagens. O ator-mirim Max Records teve que contracenar com bonecos sem expressão (que estão sendo inseridas digitalmente pela Framestore CFC), mas em contrapartida pode ouvir os monstros como eles mesmos serão. Jonze gravou todas as vozes de James Gandolfini, Lauren Ambrose, Catherine O’Hara, Forest Whitaker, entre outros, antes de filmar qualquer cena.
As expressões e linguagem corporal dos personagens foram criadas a partir das vozes, ao mesmo tempo que eram utilizadas no estúdio durante as filmagens. Sendo assim, mais do que atuar com os bonecos, Max Records atuou com as vozes de seus companheiros de set.
Se considerarmos que a produção de “Where the Wild Things Are” foi anunciada em 2003, e as filmagens começaram em 2006, Spike Jonze está trabalhando no projeto há nada menos que 6 anos. Ele teve que enfrentar o desafio de trabalhar com uma obra consagrada, ampliar o universo da história, e ainda que com a colaboração próxima de Maurice Sendak, precisou tomar decisões corajosas. Em entrevista ao Ain’t It Cool News, declarou:
“No longa, temos uma criança real em um mundo real e acredito que foi esse o problema para o estúdio. No final eles perceberam sobre o que é o filme de verdade. É como se eles estivessem esperando um filho homem e eu dei luz a uma garota. Então eles precisaram do tempo deles para perceberem isso e descobrirem como eles vão aprender a amar a nova filha”.
Ainda que aos solavancos, conseguiu levar adiante suas idéias e acabou gerando essa gigantesca expectativa, além de uma busca incessante de novas informações por parte dos fãs e da mídia todos os dias. Porém, no fim das contas, o que deve importar mesmo é receber uma carta como aquela que Maurice Sendak ganhou um dia de um garoto de 8 anos de idade:
“Quanto custa ir para onde os monstros vivem? Se não for caro, minha irmã e eu gostaríamos de passar o verão lá.”
| Com Weekly Press, NY Mag, Ain’t It Cool News e The Art Of Maurice Sendak
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