Quem deve controlar o futuro da IA?

No painel “AI and Power Concentration: Building Tech to Empower Us All” no SXSW 2025, especialistas discutiram como a IA está concentrando poder em poucas empresas, quais são os riscos disso para a sociedade e quais alternativas podem garantir que essa tecnologia beneficie a todos – e não apenas os mais poderosos.

A conversa reuniu Emilia Javorsky, diretora do Futures Program do Future of Life Institute; Daniel Kokotajlo, ex-funcionário da OpenAI que se tornou whistleblower; Lawrence Lessig, professor de direito em Harvard e especialista em regulação tecnológica; e Kylie Robison, jornalista do The Verge e mediadora do painel.

O desafio: uma tecnologia sem limites

Se a IA continuar avançando no ritmo atual, quem estará no controle? Daniel Kokotajlo trabalhou dentro de uma das empresas que lideram essa corrida e trouxe um alerta: “As empresas de IA não estão apenas tentando criar sistemas mais inteligentes. Elas querem desenvolver superinteligências – máquinas que superam humanos em todas as áreas do conhecimento.” Segundo ele, muitos dos engenheiros envolvidos nesses projetos acreditam que isso pode acontecer em poucos anos. “O problema é que estamos longe de estar prontos para lidar com isso”, disse.

Além disso, há o desafio da regulação. Lawrence Lessig apontou o absurdo de empresas bilionárias argumentarem que não precisam de nenhuma regulamentação, enquanto setores como alimentação e transporte seguem regras rígidas. “Hoje, abrir um food truck exige mais regulamentação do que lançar uma IA que pode impactar milhões de vidas”, ironizou. Ele lembrou que, na história, a regulação foi essencial para equilibrar inovação e segurança: a indústria farmacêutica prosperou com regulação, enquanto a nuclear não conseguiu se expandir justamente pela ausência de regras bem estruturadas.

O cenário político também é um obstáculo. Não há consenso global sobre governança da IA, e os poucos esforços para regular a tecnologia são fragmentados e reativos. “Estamos assistindo a um jogo de forças entre empresas de tecnologia e governos desorganizados para tentar regular um setor que se move mais rápido do que qualquer outra inovação na história”, destacou Lessig.

Os riscos: falta de proteção para denúncias e concentração de poder

Outro grande problema é a ausência de leis para proteger aqueles que trabalham no desenvolvimento da IA e percebem riscos sérios no caminho. Daniel Kokotajlo revelou que, depois de sair da OpenAI, foi procurado por muitos ex-colegas que queriam expor falhas de segurança nos modelos desenvolvidos, mas estavam impedidos por acordos de confidencialidade. “Hoje, as leis de proteção a whistleblowers só garantem segurança jurídica para quem denuncia crimes já estabelecidos. Mas a IA está operando em uma zona cinzenta, onde não há leis definindo o que é ilegal”, explicou. Isso faz com que muitas pessoas dentro das empresas tenham medo de alertar a sociedade sobre os riscos da tecnologia.

Daniel Kokotajlo, ex-OpenAI. Divulgação

Lessig defendeu a criação de um marco legal para proteger whistleblowers, permitindo que especialistas alertem sobre riscos antes que se tornem crises. Além disso, ele sugeriu um mecanismo inovador: exigir que empresas que desenvolvem IA contratem seguros. “Se todas as empresas fossem obrigadas a ter um seguro de responsabilidade, as seguradoras teriam incentivos para impor padrões de segurança. Isso criaria uma autorregulação de mercado, garantindo que a IA fosse desenvolvida de forma mais responsável”, argumentou.

O que podemos fazer?

1️⃣ Ter uma visão clara do futuro que queremosEmilia Javorsky destacou que a sociedade precisa definir o que espera da IA para criar momentum e orientar decisões políticas e de mercado. “Se não tivermos um ideal claro, ficaremos sempre reagindo às decisões das grandes empresas, em vez de moldar o futuro de forma proativa.”

2️⃣ Investir em modelos abertos e acessíveis – Uma das possíveis soluções para descentralizar a IA seria investir em modelos abertos e acessíveis, que permitam que mais pessoas e empresas utilizem a tecnologia de forma independente. Mas essa alternativa também enfrenta barreiras. “Os avanços de código aberto são rapidamente absorvidos pelas grandes empresas, que os refinam e os utilizam em maior escala”, explicou Kokotajlo. Ou seja, mesmo iniciativas colaborativas acabam sendo apropriadas pelos gigantes do setor.

3️⃣ Exigir mais transparênciaDaniel Kokotajlo reforçou que uma das maiores ameaças da IA hoje é a falta de transparência. “Não sabemos o que essas empresas estão desenvolvendo, quais testes estão sendo feitos ou quais medidas de segurança estão sendo implementadas. Precisamos exigir que elas sejam obrigadas a divulgar informações sobre seus modelos e processos.”

4️⃣ Proteger whistleblowers e mudar os incentivos de mercado – Como Lessig propôs, garantir proteção legal para denunciantes e exigir seguros para empresas pode ser um caminho para mudar a direção dos avanços da IA.

O painel terminou com um alerta de Kylie Robison: “Não podemos aceitar que a IA seja uma ferramenta apenas para quem já tem poder. A tecnologia pode ser um grande motor de inovação e inclusão – mas só se formos capazes de criar um ecossistema onde ela realmente beneficie a sociedade como um todo.”

A pergunta que fica: estamos construindo a IA para servir a todos ou para concentrar ainda mais poder nas mãos de poucos?



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Publicador por
Juliana Wallauer @jwallauer

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