SXSW 2024 – Divergir é fundamental, mas onde estão as pontes?
É imperativo questionar se estamos avançando na resolução dos desafios que deveriam ser básicos e fundamentais
Quem nunca ouviu aquele famoso ditado: “a grama do vizinho é sempre mais verde”? O que pouca gente se pergunta é: será que o verde que vejo é o mesmo que o seu? Será que a coloração que observo hoje é exatamente igual ao que vi anteriormente? Na edição deste ano do SXSW, realizada novamente em Austin, nos Estados Unidos, se tornou praticamente impossível não refletir sobre como a diversidade de percepções e ideias convergem em um único espaço.
Na saída de uma palestra emblemática por aqui, presenciei um duelo de interpretações que ilustra perfeitamente a divergência de olhares. Enquanto um colega descrevia o debate como “uma viagem sem sentido”, outro, em um intervalo de somente quinze minutos e não mais do que 100 metros de distância, exaltava o painel como “poderoso e simbólico”. Este contraste não apenas ressalta a subjetividade humana, mas também a riqueza implícita na multiplicidade de pontos de vista, algo extremamente valioso para o evento.
Em um ano onde a curadoria, o tom das palestras e o público do festival me parecem mais pragmáticos e orientados às ações — muitas vezes até buscando soluções simples para problemas complexos —, acredito que seja fundamental nos atentarmos que nem tudo é sobre o evento, e muito menos somente sobre nós. As percepções que criamos, carregamos e repassamos daqui precisam estar muito bem equilibradas por ambas as balanças. Precisamos sempre ter em mente que enxergamos o mundo por uma lente própria, mas que está em constante transformação.
Desde 1987, o festival tem se consolidado como um espaço privilegiado para o debate de ideias, mesmo as mais antagônicas. Tal capacidade de acolher discussões diversas, desde o horizonte da cultura até os avanços tecnológicos, posiciona o SXSW como um microcosmo das grandes dinâmicas e tendências globais. A riqueza deste encontro de mentes reside não apenas na diversidade de temas abordados, mas na maneira como ele desafia os participantes a expandir suas perspectivas, confrontando-os com visões de mundo que podem ser radicalmente diferentes das suas.
Isso é especialmente significativo se considerarmos que as redes sociais nos enclausuram em bolhas ao longo da última década, fazendo parecer que nossa visão de mundo é sempre predominante.
No entanto, o que tenho percebido é a existência de uma dicotomia interessante. Por um lado, existe espaço para tratar da luta por justiça social para grupos sub-representados, especialmente em gênero e raça, com alto engajamento e uma audiência diversa fazendo fila pelos corredores. Por outro, observa-se que diversos fóruns de alta tecnologia ainda são dominados por um público predominantemente masculino, branco e maduro.
Este cenário levanta questões como: onde estão as pontes que conectam essas discussões antagônicas? Será que somente a mera existência de tais espaços é suficiente para gerar mudanças significativas? Afinal, se a observação do mundo depende de lentes cada vez mais sofisticadas, somente trocas mais profundas podem enriquecer o nosso campo de visão.
À medida que nos aproximamos de um novo estágio de desenvolvimento econômico e produtivo, impulsionado pela convergência de tecnologias disruptivas, é imperativo questionar se estamos realmente avançando na resolução dos desafios que deveriam ser básicos e fundamentais. A geração T, como fomos chamados pela especialista e futurista Amy Webb, encontra-se no limiar de transformações significativas, porém, paradoxalmente, obstáculos como saúde, fome e acesso à informação em escala global permanecem latentes.
Até aqui, todo este cenário envolvendo o SXSW 2024 me gerou uma reflexão profunda: a verdadeira inovação vai além da tecnologia. Essa noção de ressignificação do crescimento reside na capacidade de ampliar o campo de visão, de abraçar a diversidade de percepções e, sobretudo, de construir pontes que unam visões de mundo aparentemente irreconciliáveis.
Que o SXSW continue a ser esse espaço de convergência, onde o futuro se constrói não apenas com tecnologia, mas com a riqueza de percepções.
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