SXSW 2023: Dessa vez Austin me assustou mais que inspirou, culpa dos próximos sete anos
Teremos anos assustadoramente revolucionários, espero que humana e tecnologicamente.
A essa altura você já leu uma penca de artigos sobre SXSW 2023, entendeu que a Web nunca mais será a mesma e que a Inteligência Artificial (IA) veio para ficar de vez e vai ser nosso assistente para tudo já, já, como parte primária da vida. A IA não vai roubar o job dos humanos, mas mudar nossos job descriptions, e os psicodélicos serão um caminho pra gente assimilar isso tudo. Ótimo! Porque não quero falar sobre nada disso de novo. Quero falar sobre como eu me senti dessa vez voltando de Austin.
Weird Austin é fato, mas também lovely Austin. Indo, pela quarta vez, à cidade, sempre para o SXSW, em março, aprendi a achar ela encantadora e a voltar grata pela inspiração. Mas, em 2023, o lance foi meio diferente. Primeiro, que tudo foi muito intenso, sem conversas café com leite. Momentos de extremos, de tecnologias realmente revolucionárias a nosso alcance em escala, ciência evoluindo a ponto de recriar mamutes extintos e a consciência real de que levamos o planeta ao limite.
E a cada conversa dessa, chaveando os temas em assuntos tão diversos e tentando criar meus próprios cenários possíveis de futuro cruzando todos eles, eu ficava de fato um pouco mais assustada — não tenho nenhuma vergonha ou pudor de admitir isso.
O nível de complexidade que chegamos em muitos aspectos — tecnológicos e humanos — é tão novo e extenso que não assimilamos de uma vez. Mas, o nível das mudanças que vamos enfrentar vai ficando muito claro. Acredito que grandes saltos de consciência vêm muito mais de estímulos bem simples do que de ensaios profundos. É que, às vezes, uma frase objetiva encontra uma mente mais pronta e aí tudo fica claro — ou claramente assustador.
Foi o que fez por mim Whurley, uma das principais referências do planeta em computação quântica e fundador da Strangeworks — uma startup empenhada em deixar essa nova tecnologia acessível a todos. Ele soltou essa frase: “Juntas, a computação quântica e a inteligência artificial vão produzir mais transformações nos próximos sete anos do que vimos em toda nossa existência”.
E não vimos pouco até aqui. Nos últimos 20 anos, vimos o mundo sair de uma realidade analógica para a digital. Talvez, você nem lembre, mas a gente vivia sem internet como parte indissociável da vida no ano 2000, e três a cada 10 pessoas no mundo viviam abaixo da linha da extrema pobreza. Hoje, é uma a cada 10 — o que ainda é muito, diga-se de passagem.
Voltando para um pouco antes, em 1950 (73 anos atrás), duas a cada três pessoas viviam na extrema pobreza, 44% da humanidade não sabia ler e escrever e a homossexualidade era crime em alguns países, como na Inglaterra. Naquele cenário, algumas cidades dos Estados Unidos não permitiam casamentos entre brancos e negros, e, em todo o mundo, havia apenas 25 democracias — quase todo o resto controlado por ditadores. As estatísticas da época também mostravam que duas a cada 10 crianças morriam antes dos 10 anos, e a expectativa de vida de quem sobrevivia era de apenas 51 anos.
Na Austin de 2023, que declara que os próximos sete anos serão mais transformadores que toda a nossa existência, tentamos equilibrar esse tipo de consciência gerada a seco, tomando uns drinks para relaxar a cabeça, coisa que combina perfeitamente com a cidade. A caminho de um bar, em grupo, onde cantaríamos Bohemian Rhapsody a plenos pulmões tomando uma marguerita, na última noite na cidade, um amigo fala outra frase que foi quase uma confissão coletiva: “Eu achava que não chegaria a ver mais grandes mudanças profundamente estruturais afetando minha vida como minha avó viu. Agora, estou convencido de que vou”.
Com um painel inteiro do evento que foi dedicado a nos mostrar que cada vez mais aumentam as possibilidades para vivermos em escala além dos 100 anos, que isso vai ser o comum, é evidente que seremos testemunhas de coisas ainda mais revolucionárias do que agora conseguimos enxergar. Onde chega tecnologia e educação, chega riqueza e ampliação da vida, foi o que a história nos mostrou. Ou deveria.
Temos, hoje, muito mais recursos para produzir resultados e negócios, prosperidade para a humanidade. O que me assusta, enfim, compreendi, é que só vamos ter real sucesso se operarmos esses recursos em comunidade (na Web 3.0 ou fora dela) — de forma inclusiva e distribuída. Isso parece ainda bem distante. Mas, se temos a chance de viver esse momento do tempo, temos que ter a ambição de fazer o melhor que pudermos.
Voltar de Austin em 2023 inspirada seria muito pouco. Para quem trabalha com tecnologia há mais de duas décadas e viu tudo o que a internet foi capaz de gerar nesse tempo, é mesmo assustador compilar o que estamos vivendo e o que vem pela frente. É também mandatório. E é pra ontem. Sem romantismo, sem desejo de dourar a pílula e de relativizar a ética, a segurança e sem medo de construir formas de fazer todo esse recurso jogar a favor dos negócios, das comunidades e das pessoas. Para nós, que começamos essa jornada faz tempo, o susto encontra rapidamente o pragmatismo.
Que venham os próximos sete anos! E que sejam assustadoramente revolucionários, humana e tecnologicamente.
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