SXSW 2023: New Order
Saem os enumerados de novidades, surgem narrativas individuais e percepções sobre o ser e o agir
Minha primeira vez no SXSW (pelo jeito, mesma situação de outro monte de brasileiros que transformaram Austin numa cidade lusófona e entoaram toca-raul-eu-não-vou-embora no show do New Order). E realmente tenho que dizer: o encontro/conferência/congresso é interessante pra caramba, superorganizado, abrangente nos olhares, contemporâneo nas pautas e tudo o mais que se imagina de um evento sobre inovação nesses tempos doidos e interessantes.
Mas se eu sempre imaginei o SXSW como um showcase de tendências e análises sistemáticas sobre o futuro, um guia norte-americano que dita e informa para onde estão indo as coisas, tive uma outra visão.
Na minha percepção de novato, os keynotes, os painéis e as entrevistas que se arvoraram de se manter nesse formato de apresentação de tendências falharam.
O Instituto DataRenato escutou diversas vezes, em caminhadas apressadas pelos corredores acarpetados do SXSW, coisas como “fui na palestra X e uai! não vi nada de novo”, “o palestrante Y não falou nada que eu não soubesse, só embalou de um jeito diferente”, “no segundo slide o palestrante W me perdeu, fiquei lendo e-mail do trabalho”.
E o que eu tiro desses comentários é que ninguém mais detém nenhuma informação com exclusividade.
Não há mais um oráculo das certezas, nenhum barômetro dos movimentos futuros da humanidade. O que é falado por lá não é necessariamente velho, mas também não significa mais uma première, como eu acredito que tenha sido no passado. As novidades não estão no Ballroom D do Austin Convention Center, mas no dia-a-dia, em algum lugar mais prosaico e acessível — um email de algum parceiro, um report de algum instituto, um estudo de alguém do time.
Até uma tal foto inédita tirada pelo Telescópio James Webb que a NASA ia apresentar no SXSW já estava online e disponível há uns tempos. Bem… ou eu procurei errado ou a NASA se enganou de arquivo na hora H (o que me leva a acreditar que, se a NASA se enganou com isso, meus amigos… os habitantes da Terra estão mais lascados do que se imaginava).
Mas há esperança: olhando macro para os dez dias de encontro/conferência/congresso, percebo que existe um renascimento de algo que sempre foi vital (na indústria da comunicação, pelo menos): uma cultura da opinião e da visão individual.
Saem os enumerados de novidades, aparecem percepções sobre o ser e o agir. Morrem os menus de tendências, voltam as narrativas individuais. Caem as futurologias, renascem as histórias e a História.
Como o show de sarcasmo do Douglas Rushkoff, que se identifica como “anarco-sindicalista-marxista-teórico-de-mídia-ex-diretor-de-teatro-judeu-novaiorquino” e que teve coragem de falar, na SXSW, um território de startupeiros, que uma startup nunca vai ser um ecossistema (por definição algo cíclico, autorregulado e autossuficiente), pois uma startup não é sustentável: ela nasce para morrer, para ser eliminada em troco de alguns milhões de dólares.
Ou um designer da California, Sambuddha Saha, que afirma, num painel sobre carros elétricos com figurões da indústria automobilística, que a filha de 22 anos não dirige, não tem interesse em aprender a conduzir um carro e ele estimula que ela continue assim. Porque, para ele, que trabalha na Volvo, carros precisam ser radicalmente repensados em sua função e forma.
É a narrativa. É o pensamento crítico. É a opinião. É se atrever.
E estes comportamentos, sim, me parecem muito mais um espírito South by Southwest: não necessariamente o Sulista Texano, mas grandes cutucadas ao ocidente dominante, tão acostumado a ditar decisões e determinar nortes dos pensamentos.
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