Como “Borat” se tornou uma das comédias mais marcantes do século 21
4 motivos que explicam o fenômeno cultural por trás do mocumentário “criado” pelo segundo maior jornalista do Cazaquistão
Num dos primeiros momentos “ambientados” nos Estados Unidos de “Borat: Fita de Cinema Seguinte”, o protagonista – vivido por Sacha Baron Cohen – brinca com a presença dominante dos smartphones. Borat relata estar surpreso em perceber que, desde a última vez em que esteve presente no país, a população local ficou viciada “em suas calculadoras”. A intenção do humor é óbvia, mas denota uma passagem de tempo que pode soar inesperada ao espectador: há pouco mais de 14 anos o mundo era outro, a ponto do celular inteligente ainda existir como mero conceito de um futuro distante.
Esta constatação vale pra tudo, incluindo o cinema. É muito difícil imaginar hoje a comédia norte-americana do mainstream longe da produção independente, mas a verdade é que este paradigma é muito recente em Hollywood. Se nos anos 1980 e 1990 o gênero foi dominante dentro da indústria, a busca dos grandes estúdios por bilheterias cada vez maiores ou de máximo custo-benefício nos anos 2000 e 2010 eliminou virtualmente o médio orçamento que viabilizava essas produções, empurrando-as até mesmo do circuito de cinemas em direção ao nascente ecossistema do streaming.
Uma outra consequência importante, porém, é que a “derrocada” da comédia de estúdio também afastou estes projetos das “cidades-set” montadas pelas produtoras. Conforme se tornou mais barato filmar tudo em regiões locais, essas produções foram devolvidas à realidade do país. Um dos vários filmes que protagonizaram essa mudança foi justamente “Borat: O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América”, um dos fenômenos culturais do agora distante ano de 2006.
Aproveitando o lançamento da continuação, o B9 – em parceria com Amazon Prime Video – lista quatro motivos que levaram “Borat” a se tornar uma das comédias mais marcantes da história.
1. À frente de seu tempo
Quando o personagem de Borat Sagdiyev foi criado, Hollywood tinha acabado de vir de um ano que tornou “Sr. e Sra. Smith” na comédia de maior sucesso e ainda tinha nomes como Judd Apatow e Steve Carell como uma revelação. “O Virgem de Quarenta Anos” tinha acabado de fazer um ano de vida, inclusive, enquanto “The Office” ainda engatinhava na programação da NBC.
Nada indicava que um mocumentário – estrelado por um personagem satírico e ultrajante originário do Cazaquistão e nascido em outro projeto de Baron Cohen (o programa “Da Ali G Show”) – fosse se tornar o hit que foi, ainda mais com direito a indicação ao Oscar de roteiro adaptado e vitória no Globo de Ouro do ano seguinte.
As participações de Sacha Baron Cohen em programas de auditório certamente também contribuíram para criar uma espécie de sensação global. Isso porque, sendo um sujeito bastante reservado e até tímido, Baron Cohen só raramente dava entrevista como ele mesmo, preferindo aparecer na pele de seus personagens. Dessa forma, Borat dominou os late shows naquele período.
2. Contra tudo e contra todos
“Borat” surgiu para muitos naquele momento como uma antítese radical de tudo que o cinema norte-americano fazia até então no gênero, mesmo com o primeiro “Jackass” já tendo reintroduzido em 2002 o formato de “pegadinhas” nas telonas. Isso porque o filme satiriza o cidadão médio e seus preconceitos, extraindo um comportamento ofensivo que só um personagem igualmente ofensivo e preconceituoso seria capaz.
O “segundo maior jornalista do Cazaquistão” também faz críticas diretas à administração Bush e sua “guerra ao terror” e comete o ato impensável de brincar com uma nudez masculina que é distante dos ideais de beleza estereotipados do país – algo que ele também faz piada em cima, vide o esquete envolvendo Pamela Anderson.
3. “Na vida real”
O longa dirigido por Larry Charles incorpora a lógica do documentário não apenas como estética, mas também de recurso narrativo crucial a toda a história. Borat e seu produtor Azamat Bagatov (Ken Davitian) são contratados pelo governo do Cazaquistão para fazer um documentário sobre a cultura e hábitos dos Estados Unidos a partir de Nova York, mas o plano logo é distorcido pela dupla conforme o repórter deseja conhecer e se casar com Pamela Anderson depois de “conhecê-la” assistindo “S.O.S. Malibu” no quarto do hotel – e dado que o orçamento é curto, ambos são obrigados a comprar um carro (de sorvete ainda) para atravessar o país em direção à Califórnia.
Embora existam esquetes marcantes no ponto de partida e final da jornada (do cocô na Trump Tower à tentativa de sequestro de Anderson na sessão de autógrafos), é na viagem dos personagens que “Borat” de fato ganha corpo porque é quando sua premissa de “aprender cultura americana com os americanos” passa a valer de fato.
4. Momentos “Very nice!”
Os esquetes apresentam uma realidade que na época parecia enterrada pela produção cultural nacional e que fazia (e faz) sentido com os valores de orgulho patriótico eternamente reiterados por esta. O momento do protagonista no rodeio, quando ele incita o público cantando a melodia do hino norte-americano com a “letra do hino cazaque”, continua a mais marcante dentro desta lógica. Borat explora, inclusive, o total desconhecimento e preconceito das pessoas sobre o Cazaquistão e países que consideram exóticos. Isso também pode ser encontrado em cenas como da aula de etiqueta e do encontro com o grupo de jovens na estrada.
Neste sentido, não deixa de ser engraçado que a continuação – “Fita do Cinema Seguinte” – tenha despertado comentários e acusações de que Baron Cohen “politizou” o personagem e “abandonou” o discurso do politicamente incorreto para tratar de maneira direta do trumpismo nos EUA. A comédia sempre foi um gênero de subversão, algo que por si só já justifica que o segundo “Borat” trate, principalmente, dos apoiadores de primeira hora do (por enquanto) presidente norte-americano.
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