Em boicote à mudança na linha editorial da revista, todos os jornalistas da Cahiers du Cinéma pediram demissão
Posicionamento da ex-equipe acontece em um momento delicado para o jornalismo mundial, com inúmeros casos de censura e a quase extinção de um jornalismo crítico
Toda a equipe de jornalistas da Cahiers du Cinéma pediu demissão depois que a revista francesa foi comprada e os novos acionistas anunciaram uma mudança na linha editorial da publicação.
De acordo com a Agence France Presse, os 15 funcionários optaram pela demissão coletiva após a venda recente da revista que, segundo o comunicado, criou “um conflito de interesses para a publicação crítica”. Os novos donos, incluindo 8 produtores de cinema, desejam “suavizar” as avaliações da Cahiers, transformando os artigos em leituras mais acessíveis, o que é bem diferente da tradicional abordagem das edições mensais da revista, conhecida por artigos sempre muito críticos e profundos com avaliações socioculturais bem mais amplas que apenas a análise de um filme.
A venda da revista foi realizada por Richard Schlagman, ex-proprietário da editora Phaïdon e atual dono do jornal Le Monde. Cerca de 20 acionistas compõem o grupo de novos chefes da Cahiers, entre eles proprietários de canais de TV a cabo, banqueiros, empresários e produtores de filmes. “Nos anos 50, a revista foi fundada para fazer guerra ao cinema francês. Agora, os novos proprietários querem fazer com que seja sobre resenhas ‘chiques’ e ‘cordiais’, é um absurdo absoluto”, disse Jean-Philippe Tessé, vice-editor e jornalista de Cahiers por 17 anos.
Ao Le Monde, os novos acionistas negam que tenham instruído qualquer mudança radical na revista. Nos últimos anos, as vendas da Cahiers du Cinéma caíram, mas não de forma tão drástica quanto o sofrido por outras publicações ao redor do mundo. A média passou de 15 mil cópias vendidas em 2015 para 12 mil em 2019.
A atitude dos jornalistas acontece em um momento complicado para o cinema na França, especialmente após a polêmica sobre a participação de Roman Polanski no César Awards, premiação na qual o diretor recebeu 12 indicações pelo filme “O Oficial e o Espião”. Mais ainda, o posicionamento da ex-equipe da Cahiers acontece em um momento delicado para o jornalismo mundial, com inúmeros casos de censura e a quase extinção de um jornalismo crítico que não seja ditado pelos interesses de empresários e grandes corporações.
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